A bizarra prisão de Temer. Por Ricardo Noblat – Heron Cid
Bastidores

A bizarra prisão de Temer. Por Ricardo Noblat

22 de março de 2019 às 09h30 Por Heron Cid
Michel Temer, ex-presidente da República, preso pela PF - 21/03/2019 (Band TV/AFP)
O que distingue a situação do ex-presidente Lula da situação do ex-presidente Temer é o seguinte: Lula só foi preso depois de condenado duas vezes por um tribunal da segunda instância da Justiça. Temer está preso sem sequer ter sido julgado. Essa pode ser a chave para que ele acabe libertado nas próximas horas ou dias.

Em parte alguma do mundo dito civilizado, um ex-presidente da República vai para a cadeia com base apenas num inquérito ainda em fase preliminar. Sim, a lei é igual para todos. Mas um ex-presidente não é qualquer um. Chegou ao poder pelo voto. Chefiou o Estado. Representou o país lá fora. Isso faz diferença.

A ordem de prisão contra Temer assinada pelo juiz federal Marcelo Bretas, do Rio, está mais para uma peça política do que para uma peça jurídica de fato convincente. Está repleta de recados e de indiretas para o Supremo Tribunal Federal que, na semana passada, decidiu limitar o alcance da área de atuação da Lava Jato.

Ampara-se na delação do dono da empresa de engenharia Engevix, José Antunes Sobrinho, que disse ter pagado propina a Temer por meio do seu faz tudo, o coronel João Batista Lima. Mas não explica por que a Lava Jato, em 2016, sob o comando do juiz Sérgio Moro, recusou-se a fechar o acordo de delação proposto por José Antunes.

Em duas ocasiões, pelo menos, Bretas faz menção no seu despacho à fragilidade de sua decisão de prender Temer e outros. Diz a certa altura:

“É certo que não há, por ora, um decreto condenatório em desfavor de nenhum dos investigados, e a análise a ser feita adiante sobre o comportamento de cada um dos requeridos é ainda superficial.”

Para em seguida acrescentar:

“Mas o fato é que os crimes de corrupção e outros relacionados (…) numa análise ainda superficial hão de observar o regramento compatível com a sua gravidade, além da necessidade de estancar imediatamente a atividade criminosa”.

Falta a descrição de fatos concretos, inquestionáveis, da “atividade criminosa” exercida por Temer que possa ameaçar a produção futura de provas contra ele além das já coletadas até aqui. Por fim, Bretas não responde a uma pergunta crucial: por que Temer em liberdade representaria um perigo à ordem pública ou à segurança jurídica?

O Código de Processo Penal diz no artigo 282, parágrafo 6º, que a prisão preventiva só “será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar”. São várias as medidas cautelares que poderiam ser aplicadas a Temer, mas não. Bretas só enxergou como justa e razoável a sua captura.

“Enfim, é mais uma surpresa desses tempos estranhos, como diria o ministro Marco Aurélio Mello”, declarou surpreso José Paulo Sepúlveda Pertence, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal. “Foi mais um abuso, e como esse já vimos muitos”, decretou o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), que nunca gostou de Temer.

“Uma barbaridade” – limitou-se a comentar Temer na hora em que foi preso em meio ao trânsito da capital paulista.

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