Na década de 70, o cearense Antônio Carlos Belchior, ou simplesmente Belchior, cantou o seu tempo numa canção plangente, crua, dura, realista. Ele retratava a adversidade de quem se “desesperava” em tempos sombrios, numa crítica a quem, enquanto isso, apenas sonhava.
No Sertão da Paraíba, Marizópolis, minha terra natal, ontem, autoridades, especialistas, estudiosos, dirigentes de instituições de ensino superior e técnico, deputados, prefeitos, vereadores e secretários se uniram no mesmo coro dos “descontentes”.
Unissonamente, deram um “grito em português”.
O grito de quem desesperadamente discorda de um modelo de desenvolvimento histórico que não pensa as regiões de forma integrada, que marginaliza o que tenho chamado de “interior do Interior”. Um grito de quem tem pressa de oportunidades de crescimento e trabalho.
A Carta de Marizópolis, documento formatado a partir do resultado dessa provocação inicial de debate, exorta a Paraíba, os governos, os poderes, o parlamento, as universidades a ampliarem o olhar para municípios da periferia das cidades polos do Interior.
É uma crítica contra uma lógica que incha quem já tem muito e nega aos demais municípios dos respectivos entornos o direito de também de serem senhores do destino, punindo essas populações com a marginalização, o subdesenvolvimento.
Condenando-as, por ação ou omissão, à perversa condição de serem vistas apenas como pequenos pontos insignificantes no mapa, dignos de ações pontuais, não de olhar sistêmico, como alvos de ações redentoras capazes de equilibrar riquezas e desenvolver regiões de forma sustentável.
Como canta Belchior em A Palo Seco, “sei que assim falando pensas que esse desespero é moda” nesse atual tempo.
Mas é um “desespero” dos que pregam desenvolvimento integrado de suas potencialidades (que são muitas) com a região e alternativas de geração de renda contra o desemprego, uma chaga para populações cansadas de viver exclusivamente reféns de prefeituras ou de lembranças a cada quatro anos.
Um grito de quem cansou de ser problema e se coloca como solução. Não haverá uma Paraíba rica enquanto praticamente todo o seu território for pobre e sem perspectivas.
Essa mensagem transcende a audiência pública de ontem que envolveu Marizópolis, Sousa, Cajazeiras, São José da Lagoa Tapada, Nazarezinho e São João do Rio do Peixe.
Esse grito seco não poderia sair de lugar mais emblemático do que uma cidade de 7 mil habitantes, Marizópolis, minha terra natal, um “ponto de intersecção” entre dois polos importantes e pujantes do Estado, Sousa e Cajazeiras.
Que esse “canto torto, feito faca, corte a carne de vocês”.