Engorda das praias de João Pessoa tem justificativa magra e debate raso – Heron Cid
Opinião

Engorda das praias de João Pessoa tem justificativa magra e debate raso

7 de fevereiro de 2023 às 21h22
Conforme projeto, até lateral da Falésia do Cabo Branco sofrerá intervenção com via de carros no pé da barreira (Foto: Rafael Passos)

A Prefeitura de João Pessoa planeja aterrar e ampliar as faixas de areia das praias de Manaíra, Caribessa e até do Cabo Branco. O prefeito Cícero Lucena reforçou a intenção, nessa terça-feira, dia em que levou mensagem à Câmara Municipal.

Obra dessa magnitude e forte risco de impacto ambiental exige uma discussão profunda. Até agora, porém, o debate é muito superficial e as motivações estão abaixo do nível do mar.

Quem se preocupa com anúncio tem razões de sobra. Basta uma rápida pesquisa para constatar que praticamente todas as capitais que optaram pelo aterro das praias, com obras de engorda, precisam administrar transtornos.

No caso de João Pessoa, a obra não consta no debate da eleição de 2022, não se tem notícia que figurou em planos de governo e nem foi promessa do então candidato Cícero Lucena.

O assunto é tratado com algumas reservas. Secretários de pastas estratégicas, como Planejamento e Infraestrutura, evitam falar. Só quem toca no tema é o próprio prefeito e quando instigado.

Pela envergadura, faltam maiores explicações, debate mais aprofundado com a cidade, e sobram questionamentos.

Desde quando, o aterro da praia é uma demanda da cidade? Que segmentos reivindicam essa intervenção na fisionomia natural de João Pessoa, aliás, admirada pelo seu diferencial qualitativo, sustentável e de beleza?

Em meio a tantos problemas e desafios do cotidiano, essa é uma prioridade de João Pessoa? Prioridade para quem? Qual a opinião de especialistas, ambientalistas, ong’s e universidade?

A cidade que sempre priorizou o discurso da preservação ecológica, que sempre manteve a legislação que barra espigões, que acabou de fazer um milionário empréstimo ao Bid sob o compromisso da sustentabilidade, quer mudar essa agenda e optar pela política da expansão imobiliária e da construção civil?

Banhistas e turistas pedem mais espaço na areia? Se aplica para João Pessoa a receita da engorda, ministrada em praias onde as faixas de areia são mínimas, o que, no geral, não é nosso caso? Há problema grave de mobilidade na orla marítima que justifique essa ruptura com a natureza e investimentos aproximados de R$ 200 milhões? O farol da obra obedece a uma bússola do bem estar coletivo ou ao interesse econômico de setores da iniciativa privada?

Com argumentos técnicos, diálogo com a sociedade e audiências públicas, pareceres de experts no assunto, a Prefeitura de João Pessoa pode até sim convencer a cidade do contrário, e provar científica e socialmente a viabilidade e necessidade da receosa intervenção na paisagem e ecosistema pessoenses, mas até aqui o debate da engorda é pra lá de magro de justificativa e raso de argumentos.

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