A cena interrompeu o mergulho matinal e silencioso em mim mesmo. Sempre que possível, uma contemplação ao divino e à natureza.
Os olhos mal se abriram da meditação e eu vi bem um brasileiro misturado entre os poucos banhistas daquela hora.
Quis só contemplar. Não resisti. Desci às areias e o segui. Ele nem deu conta de minha presença. Pouca coisa à volta importava.
Por hábito, pus a câmera-celular em ação. A imagem era icônica demais para guardar só nas retinas. Eu vi um brasileiro.
Andei calado com aqueles passos lentos, de um canto a outro, no balé do caçador.
Era um ritual. Depois de limpar a rede da última investida e remover sargaços, arrasta-se para fora com ela até repetir tudo de novo. Uma, duas, três vezes… Eu vi um brasileiro.
Dentro d’água, anda em roda devagar, junta uma ponta à outra e fecha-se o círculo.
De volta à margem, alguns poucos peixinhos do tamanho de nada se debatem. Carapibus, sardinhas e outros minúsculos habitantes entram na sacola plástica pendurada ao pescoço do velho pescador.
Vestia camisa verde e amarela da seleção nacional de futebol e o número 10 nas costas. Foi a primeira coisa que vi, ainda de longe. Eu vi um brasileiro. Brasileiro não descansa. Brasileiro não desiste.
Os dois a sós, provoquei súbito diálogo.. Seu Rubens, 80 anos, casado, pai de um casal de filhos.
“Dez anos atrás, eu ainda entrava (no mar). Agora, não aguento mais. Dez anos para quem é novo não faz diferença, mas para quem já é velho…”. Era sobre si e a velhice que ele falava. Mas, também sobre mim, a juventude e o tempo.
Um pescador bem brasileiro e uma verdade universal.