O célebre filme, do final da década de 1960, é uma metáfora sobre as falsidades públicas, desmentidas por comportamentos privados, no caso da película o racismo. Na campanha presidencial o capitão cuspiu no prato que comeu e rasgou o menu da velha política, esturricando seu principal Chef, o centrão, mesmo depois de ter passado por 8 legendas do grupo anteriormente. Na convenção do PSL, em 22 de julho de 2018, o General Augusto Heleno, o mestre cuca aposentado que tentou salgar a democracia, depenou o grupo. Parodiou Bezerra da Silva: “Se gritar pega centrão, não fica um meu irmão”. Para ele centrão é sinônimo de ladrão.
O capitão foi coagido a tirar da boca de Eduardo Bolsonaro o filé mignon da embaixada nos EUA. Auxiliar de cozinha nos tempos de chapeiro no Maine, Eduardo Bolsonaro é outro que sugeriu o indigesto cardápio golpista e, antes, apimentou o discurso contra os mais famélicos comensais da república: “Mais difícil do que chegar lá, é se manter lá. Eu queria tirar foto de cada um dos senhores aqui para saber se em 2019, quando o couro comer para valer, vocês vão se deixar seduzir pelo discurso do centrão ou se vão manter firmes e fortes com Bolsonaro”. O couro comeu e o capitão se rendeu. Convidou o centrão à mesa para se empanturrar no rega-bofe.
No início do banquete os convidados beliscaram, discretamente, apenas alguns canapés. As entradas foram o FNDE, BNB, FNS, DNOCs, CBTU e Itaipu. Os petiscos serviram para abrir o apetite até avançar sobre o prato principal, acompanhamentos e se lambuzar nas sobremesas. O deputado Fábio Farias virou ministro e temperou as verbas publicitárias. O deputado Ricardo Barros se tornou o maitre político e fritou em fogo alto 14 dos mais avinagrados vice-líderes bolsonaristas. Entre aqueles abandonados à própria flatulência estão Bia Kiss, Carla Zambelli e Otoni de Paula. Ficarão com a azia causada pelos processos no STF e um mal-estar prolongado.
O deputado Arthur Lira é um dos principais cozinheiros do centrão e candidato Bolsonarista no rodízio da presidência da Câmara. A parceria já proporcionou bons digestivos ao parlamentar. Depois de ser denunciado pelo Ministério Público Federal, sob a acusação de receber propinas suculentas de R$ 1,6 mi de uma empreiteira, ele acaba de ser poupado. Entre a primeira denúncia – pesada – e o recuo na convicção do MP, passaram-se 3 meses e nenhum fato jurídico ou policial novo. Apenas os novos temperos políticos a partir do livro de receitas do centrão.
A cereja do bolo veio no começo de outubro. A vaga no STF, prometida para Sérgio Moro, depois para alguém “terrivelmente evangélico” ou quem bebesse cerveja com o capitão, ficou com um católico crismado pelo centrão. O desembargador Kássio Nunes pode até parecer insosso, mas tem o estômago de avestruz, como as emas do Alvorada, para a digestões difíceis. Nem a Santa Ceia despertou tantos apetites como a estratégica vaga na Corte Suprema. O caldo entornou para Augusto Aras, Marcelo Bretas, João Otávio de Noronha, André Mendonça e outros que salivavam pela vaga. O prato principal foi servido a quem, até a última hora, não tinha nem o nome na lista de convivas.
Kássio Nunes não terá dificuldades em ser chancelado pelo Senado Federal. Seu ingresso na seleta ceia do STF implicará em um reequilíbrio enjoativo à lava jato, já em estado avançado de desnutrição depois dos vários desarranjos intestinais recentes. Gilmar Mendes e Dias Tofolli foram chamados a opinar na área VIP do estabelecimento. Mendes, em julho, atravessou uma espinha na garganta dos militares. Acusaram-no de usar um condimento amargo ao qualificar como “genocídio” o enfrentamento da pandemia. O STF foi alvo do próprio Bolsonaro (“chegamos no limite”, “acabou porra”), dos aliados defendendo o fechamento e 2 ministros foram objeto de pedidos de impeachment. O azedume passou e o molho é mais palatável agora.
A mudança no paladar do capitão é inequívoca, tanto que congelou a lava jato. Não se faz omeletes sem quebrar os ovos. Eles foram quebrados no COAF, na liminar pró Flávio Bolsonaro, na lei de abuso de autoridade, no fundo eleitoral, no Juiz de garantias, na indicação de Augusto Aras, nos cargos ao centrão, ao desossar de Sérgio Moro e na aproximação com a ala garantista do STF. Tudo contra o cerco do Ministério Público do Rio de Janeiro, prestes a denunciar o 01. O STF se mostra como um santuário para proteger os filhos, terminar o mandato e tentar a reeleição.
Com a casa sob nova administração o sushiman Paulo Guedes assiste, defumado, sua lâmina perder o fio enquanto aquecem o fogo de sua cocção. O centrão mandando no estoque da cozinha significa resistências às privatizações, aos cortes e até o teto do restaurante está ameaçado. O centrão tem o liberalismo retórico, desmentido pelo apreço ao estado inchado, aparelhamento da máquina pública, aumento de gastos sociais e pouco apetite por desestatizações. Quando a comida fica com o gosto amargo costumam abandonar a boca livre, como fizeram com Fernando Collor e Dilma Roussef.
Nas redes sociais o verbo jantar ganhou novas acepções. Está associado ao conceito de que alguém se deu bem e “jantou” oponentes em um embate, ou seja, venceu. O bolsonarismo raiz, lavajatistas, Sérgio Moro, o Muda Senado, o PSL e fascistas têm na ponta da língua a resposta amarga ao título: Afinal, quem veio para jantar? Todos sabem que, pela voracidade, o centrão não veio apenas para o jantar, mas para o almoço, o café da manhã, lanchinhos, convescotes e outras boquinhas. Há anos eles ocupam as melhores mesas, usam os talheres de prata e saboreiam os melhores cortes. O Brasil reingressou no mapa da fome e eles não largam o osso.
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