Vem tarde e dará em nada o “mea culpa” do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso por ter aceitado a aprovação pelo Congresso da emenda constitucional que permitiu sua reeleição. A emenda foi proposta por Mendonça Filho, um deputado pernambucano que à época estreava na Câmara. Ninguém deu bola para ela. Até que um dia se deu.
Disse Fernando Henrique, em artigo que alcançou larga repercussão no fim da última semana, que a emenda foi aprovada porque se temia a eleição de Lula, derrotado por ele em 1994, e, antes disso, por Fernando Collor de Mello em 1989. Houve denúncias de que a reeleição fora comprada. Ele nega seu envolvimento com a compra de votos. E mais não disse.
Não disse, por exemplo, que a proposta de reeleição presidencial só foi engolida pelo Congresso porque passou a abranger a reeleição para os governos de Estados e as prefeituras. Por dever de justiça, diga-se em seu socorro que ele era contra. Mas, e daí? Se ele podia, por que os outros não? Onde se abre uma brecha, a manada faminta avança em louca disparada.
Em seu ato de contrição, Fernando Henrique também omitiu que o presidente Itamar Franco, desconfiado, chamou-o para uma conversa reservada antes de indicá-lo à sua sucessão. Itamar queria saber se caso fosse eleito, Fernando Henrique se contentaria em governar por um mandato ou se passaria a flertar com a possibilidade da reeleição.
Itamar era tudo, menos bobo. Já ouvira falar a respeito. E pensava em ser candidato à sucessão de Fernando Henrique, pois se limitava a completar metade do mandato de Collor, derrubado por um pedido de impeachment. Fernando Henrique respondeu a Itamar que era contra a reeleição, que sempre fora e que seria. Itamar nunca o perdoou por causa disso.
Por uma diferença mínima de votos, Fernando Henrique escapou de ser obrigado a disputar com Lula o segundo turno da eleição de 1998. Foi um susto e tanto que ele e seus apoiadores levaram. Mas dali a mais quatro anos, tendo realizado um segundo governo pior do que o primeiro, Fernando Henrique assistiu impotente a eleição de Lula. Até gostou. Quem sabe não o venceria em 2006?
O fim da reeleição não foi bandeira de campanha de Lula na versão paz e amor do marqueteiro Duda Mendonça, mas ele dizia ser contra governar por oito anos consecutivos. Nada fez, porém, para acabar com a reeleição, nem para si nem para quem o sucedesse. Assim como Dilma nada fez. Bolsonaro, sim, usou e abusou em campanha da promessa de acabar com a reeleição. E, agora…
Agora é só no que pensa. Não governa para outra coisa. Cada medida que baixa leva em conta seus efeitos sobre o que de fato importa para ele e seus milicianos – ficar no poder o maior tempo possível, pelo bem ou pelo mal. Pelo bem sendo reeleito democraticamente, como deseja. Pelo mal, forçando sua recondução ao cargo por meio de trapaças.
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