A carta e o erro de Lula. Por Reinaldo Azevedo – Heron Cid
Bastidores

A carta e o erro de Lula. Por Reinaldo Azevedo

25 de outubro de 2018 às 08h30

Para derrubar o governo da presidenta Dilma Rousseff, em 2016, juntaram todas as forças da imprensa, com a Rede Globo à frente, e de setores parciais do Judiciário, para associar o PT à corrupção. Foram horas e horas no Jornal Nacional e em todos os noticiários da Globo tentando dizer que a corrupção na Petrobrás e no país teria sido inventada por nós.


Pouco importa se a rusga de Lula é com a TV Globo ou com outro meio de comunicação qualquer. Vejam aí exercitada a velha tese do golpe. Ora, o objetivo da carta não era buscar eleitores antibolsonaristas que não se identificam com o PT? Afinal, os petistas já votam em Haddad. O que pretende o ex-presidente? Que eventuais apoiadores do impeachment de Dilma — que só caiu porque afundou o país na recessão e no desemprego — façam antes um mea culpa para votar em Haddad? Ademais, na crítica à imprensa, ele e Bolsonaro poderiam dar as mãos, não é mesmo?

Esconderam da sociedade que a Lava Jato e todas as investigações só foram possíveis porque nossos governos fortaleceram a Controladoria Geral da União, a Polícia Federal, o Ministério Público e o Judiciário. Foi por isso, e pelas novas leis que aprovamos no Congresso, que a sujeira deixou de ser varrida para debaixo do tapete, como sempre aconteceu em nosso país.

A observação traz um paradoxo inelutável. Se o PT criou, então, os tais mecanismos contra a corrupção — e nunca ninguém negou que eles, com efeito, avançaram sob o petismo —, não há por que reagir a suas investigações e acusações, certo? Se o PT impediu que se varresse a sujeita para debaixo do tapete, o que apareceu era a que estava sobre o tapete.

Apesar da perseguição que fizeram ao PT, o povo continuou confiando em nosso projeto, o que foi comprovado pelas pesquisas eleitorais e pela extraordinária recepção a nossas caravanas pelo Brasil. Todos sabem que fui condenado injustamente, num processo arbitrário e sem provas, porque seria eleito presidente do Brasil no primeiro turno. E resistimos, lançando a candidatura do companheiro Fernando Haddad, que chegou ao segundo turno pelo voto do povo.

É um erro Lula confundir, numa carta como essa, o seu caso com a eleição. Essa escolha do partido, vamos convir, está na raiz da ascensão de Bolsonaro. Todos sabem que acho que foi condenado sem provas no caso do apartamento de Guarujá. Mas essa era uma batalha a se travar na Justiça, não nas urnas. Mas agora vem o pior.

Fico pensando, todos os dias: por que tanto ódio contra o PT?

Será que nos odeiam porque tiramos 36 milhões de pessoas da miséria e levamos mais de 40 milhões à classe média? Porque criamos 20 milhões de empregos com carteira assinada, em 12 anos, e elevamos o valor do salário mínimo em 74%? Será que nos odeiam porque fortalecemos o SUS, criamos as UPAS e o SAMU que salvam milhares de vidas todos os dias?
Ou será que nos odeiam porque abrimos as portas da Universidade para quase 4 milhões de alunos de escolas públicas, de negros e indígenas? Porque levamos a universidade para 126 cidades do interior e criamos mais de 400 escolas técnicas para dar oportunidade aos jovens nas cidades onde vivem com suas famílias?
Talvez nos odeiem porque promovemos o maior ciclo de desenvolvimento econômico com inclusão social, porque multiplicamos o PIB por 5, porque multiplicamos o comércio exterior por 4.


E Lula se se estende largamente sobre as conquistas do PT. Nem vou entrar no mérito se tudo se deu como ele fala. Venham cá: será que o PT está nessa situação por suas virtudes? Eis o erro essencial. Eis o partido que se nega a fazer uma autocrítica, mínima que seja. Sim, numa carta como essa, concedo, não é hora para isso. Mas também não cabe a provocação tola de achar que o partido hoje perderia a eleição em razão de suas virtudes. Será que os eleitores de Bolsonaro, onde se contam multidões de pobres também, não gostam dessas conquistas? Será que pobre não gota de ver pobre passando bem? Lula terá parado para se indagar quantos dos quatro milhões de alunos de escolas públicas que foram para as universidades votam em Bolsonaro? Se era para falar das virtudes do PT, como se estivesse numa propaganda eleitoral, por que, então, não falar de alguns defeitos? Serão injustas e infundadas todas as acusações de roubalheira? Uma coisa é fazer reparos aos danos que a Lava Jato provocou ao processo político, confundindo a própria política com crime; outra, distinta, é negar que tenha havido fatos criminosos. Mais: a população reagiu também ao desastre que Dilma provocou na economia. E não foi invenção da imprensa.

Neste momento em que uma ameaça fascista paira sobre o Brasil, quero chamar todos e todas que defendem a democracia a se juntar ao nosso povo mais sofrido, aos trabalhadores da cidade e do campo, à sociedade civil organizada, para defender o estado democrático de direito.
Se há divergências entre nós, vamos enfrentá-las por meio do debate, do argumento, do voto. Não temos o direito de abandonar o pacto social da Constituição de 1988. Não podemos deixar que o desespero leve o Brasil na direção de uma aventura fascista, como já vimos acontecer em outros países ao longo da história.

Esse final recobra aquele que seria o espírito correto da carta. Ocorre que boa parte dela explica por que Bolsonaro deve vencer a eleição no dia 28. E pelo voto. O PT se nega a reconhecer os próprios erros e acredita que será derrotado por suas virtudes. E esse é o maior de todos os erros.

RedeTV

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