O Clube do Chicão – Heron Cid
Crônicas

O Clube do Chicão

13 de julho de 2025 às 12h55 Por Heron Cid
Multidão lotava o que virou o maior acontecimento do ano (Foto ilustrativa/Internet)

Ainda nem tinha completado os 15 anos e era vidrado numa mocinha um pouco mais velha. Me ajeitei todo e fui à festa na esperança de vê-la, mesmo sabendo que a dita cuja já tinha compromisso. Era show dos Trepidant’s, de Pernambuco. Alguma amiga dela veio ao meu ouvido e entregou a fita: “Sabia que ela acabou de terminar o namoro”? No meio da multidão, deixei a timidez de lado e dei um jeito de chamá-la para dançar. Ela arranjou um consolo para a noite e eu ‘a namorada que sonhei’, tal qual cantava Nilton César.

Foi assim comigo e com muita gente da minha geração. Naquela Marizópolis, aguardávamos meses e contávamos os dias paras as festas do Clube do Chicão – o cenário dessa cena romântica que foi eterna enquanto durou alguns poucos meses. O lugar foi o palco principal dos grandes eventos do distrito e depois da cidade.

O nome do Clube levava o apelido do seu proprietário, Francisco José da Silva, o Chicão, produtor cultural que fazia o calendário das principais festas dos anos 90 e 2.000. O Grupo Show Terríveis, de Natal-RN, por exemplo, estava lá todo ano. No Dia dos Pais, era sagrada a seresta do talentoso João Dino. Dono de voz melodiosa, o cearense ia de mesa em mesa, cativando sua plateia fiel.

Minha mãe, Marizete, era uma das suas fãs. Não perdia uma apresentação e ainda trazia a fita cassete do show. Ouvíamos todo fim de semana, enquanto arrumava-se a casa. Devo a essa providência o hábito de gostar de músicas antigas e de conservar até hoje a afeição sonora por Moacir Franco, Altemar Dutra, Antônio Marcos, Jovem Guarda, The Fevers, Renato e Seus Blue Caps, entre outros de um tempo que não vivi, mas as canções tocaram em mim.

Por conta da audição dessas fitas, aprendi a dançar alguns passos. Pé de valsa, mainha me pegava pelo braço e tentava me ensinar. Não fui lá um bom aprendiz. Porém, o pouco foi o suficiente para não passar totalmente em branco em algum baile da vida e nas festas do Clube do Chicão me arriscar a puxar alguma pretendida para o salão, como fazia no tradicional Reveillon.

Todo dia 31 de dezembro, a pequena e pacata cidade parava para curtir ‘Maguila e Seus Teclados’. Filhos e famílias ausentes aproveitavam a data para se reencontrar em mesas numeradas, previamente reservadas e compradas. Vinha gente de São Paulo, do Rio de Janeiro e recantos do Brasil. Quase tudo sempre filmado por Zé Leite de Andrade, mais tarde batizado por mim de Zé Coragem, e João Pindoba, os únicos que tinham máquinas com tecnologia para o registro à posteridade.

Na portaria, Eliane e os filhos providenciavam os ingressos de quem não tinha comprado antecipadamente. A fila era grande e as margens da BR-230 e redondezas ficavam lotadas. De gente e de carros. Mas ninguém ficava de fora e todo mundo garantia sua presença no que se transformou no maior acontecimento do ano, fama que atraiu muitas pessoas de cidades vizinhas.

Com sua voz potente, Maguila desfiava o seu tradicional repertório. Das românticas ao forró, todo o gosto era atendido. Notícia boa para o bar, que vendia tudo nessas noites de virada. De ano e de copo. A segurança da PM, reforçada por guardas civis, quase não tinha trabalho. O ambiente era de pura celebração e brindes de refrigerante, cerveja e doses de montilla com coca-cola.

Até que chegava a esperada e festejada contagem regressiva em que nós e o Clube do Chicão inteiro, ao som de Maguila, erguíamos a voz e os braços, deixávamos para trás as “marcas do que se foi” e cantávamos os “sonhos que vamos ter”. À meia noite em ponto, o adeus ao ano velho e as boas vindas ao novo ano. Os anos novos que agora são velhas e boas lembranças.

Depois da festa, a fita do show rodava o ano inteiro nos aparelhos de som e nos corações saudosos, em nova contagem regressiva

Comentários