Ao entrar no Canelle, avistei-0 logo de frente, no cantinho do restaurante. Sentado na mesinha estrategicamente posta, o autor atendia os amigos e admiradores que fizeram fila para levar para casa o combo – livro, autógrafos e o registro fotográfico.
Um relâmpago temporal me incandesceu. Vi um jovem leitor tentando filar leitura grátis do Correio da Paraíba em alguma repartição pública e se encantando com texto limpo, abordagem crítica e pegada inteligente da coluna política da página A4.
Numa mesa parecida, no recanto da Assessoria de Imprensa da UFPB, revi o primeiro mentor do estagiário de Jornalismo. A paciência para ensinar, orientar, o convite a refazer, as sacadas inteligentes no meio das conversas numa redação de craques.
Dele, o ‘sim’ à oportunidade – ou irresponsabilidade benfazeja – de autorizar o incipiente aluno a virar correspondente da Universidade na emissão de informes e boletins para as rádios do Interior.
Recordei a superação da timidez para arranjar coragem de conversar com o ‘chefe’ e contar as dificuldades de subsistência de estudante já casado e pai de uma filha. De retorno, um escuta sincera, dicas, sugestões e ligações para aberturas de portas.
Da UFPB ao estágio do TRE, após aprovacão em concurso pescado e sugerido por ele. A nova bolsa já subiu de valor e aliviou a precisão de quem morava num quitinete de fundo de quintal no Castelo Branco, onde jovem casal dividia cama de solteiro.
Ainda na fila, atacou-me a lembrança do dia da defesa do trabalho final de curso – passaporte para novos voos. A nota da monografia “A Coluna de Rubens Nóbrega – espaço politizante na imprensa paraibana” só não foi maior que a emoção do aprovado. Principalmente, pela presença firme e incentivadora do mestre num começo de manhã no DECOM.
Dia seguinte, o registro generoso na tal coluna com a profecia de que “em breve” aquele aprendiz, agora diplomado, estaria em algum palco do jornalismo. Talvez nunca soube, mas esse cartão de apresentação abriu a feliz porta de contratação no Correio Debate, na 98 FM, para quem precisava muito de um emprego.
E lá estávamos na mesma redação. Ele no comando do Portal Correio, eu cavando pautas de repórter da rádio. Até em 2010 dividirmos o programa Balanço Geral, com Ruy Dantas de âncora. Um ano depois, o seu pedido de demissão desafiou horóscopo e alinhou os astros.
Apenas quatro anos após aquela ousada profecia, coube-me – por pura providência celestial – suceder o mestre naquela mesma coluna que um dia fora leitor assíduo e pesquisador dedicado. E a vida daquela principiante jornalista, precocemente obrigado a amadurecer, nunca mais seria a mesma.
Ao avançar na fila dos autógrafos, esse filme arrebatou a alma em poucos segundos. Enfim, de frente ao autor, naquela manhã chuvosa, olhos derramaram emoção e lábios trêmulos só conseguiram balbuciar um “muito obrigado”!
Depois daquele dia, sorvi, de um gole só, as ricas “Memórias do Batente”, de Rubens Nóbrega, nosso oráculo da imprensa paraibana. Tive surpresas com revelações, mas também li coisas e fatos históricos de bastidores que ele já havia me privilegiado, 20 anos atrás, em entrevista para a monografia.
Um livro que, para além do auto-retrato de uma carreira emblemática, digna e respeitável, narra meio século de um tempo fértil, criativo e conturbado e do jornalismo paraibano, suas contradições, modos de produção, muitos já extintos, práticas, lutas e perfis dos profissionais de uma marcante época. Cápsulas que merecem ser revisitadas por jornalistas do presente e do futuro.
Ao fechar a derradeira página da obra, terminei convencido, por experiência própria, que há muitas memórias de Rubens Nóbrega por aí a serem contadas. Cabem tanto em novos livros de jornalismo quanto em velhos testamentos de gratidão. Essa aqui é só uma delas. Da série que não pode só ficar guardada no coração.
