Com a câmera ligada, e alguns questionamentos já gravados, mirei o microfone e perguntei no alvo: “Quem é Vital Farias”? Da boca do filho de Taperóa, a resposta embargada: “Um matuto da roça”! Como chuva no Cariri, dos olhos do trovador desaguaram rios de emoção e nostalgia, transbordando um coração encharcado.
Guardo na viva memória essa cena do meu primeiro encontro com o cantor e compositor de Veja (Margarida). O que, sem avisar, partiu para a ‘cidade garantida’ da eternidade.
Era uma entrevista para o Pingo Quente, um quadro político que apresentava no Jornal da Correio, da TV Correio, em 2010, ano em que o cantador trocou por alguns meses a viola e desafiou as regras prontas do jogo da política e foi rimar seus versos como candidato ao Senado.
Movido pelo instinto de rebeldia cidadã, foi às urnas e obteve delas 58 mil votos pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB). Por óbvio, não ganhou a eleição. Afinal, já estava eleito, há muito tempo, como mestre do cancioneiro popular do país, com suas Ai que Saudade de Ocê, Saga da Amazônia, Caso Você Case…
A lembrança pessoal sobre a flagrante sensibilidade humana, poética e campesina de Vital foi apenas uma amostra entre tantas. Um homem marcado pela rudeza das lidas da vida, mas profundamente tocado pela beleza das coisas simples. Coisas que cantou e imortalizou em suas letras de protesto, de amor e convites à reflexão.
Com Rolando Boldrin, Vital também não teve vergonha de sangrar os olhos diante de um ‘Senhor Brasil’ inteiro ligado na TV Cultura. Também foi às lágrimas, cantando com a filha Giovana. Numa de suas últimas aparições, no programa de Jessier Quirino, também caiu no choro ao lados dos dois filhos mais novos.
Foi essa humanidade à flor da pele que o transportou do solo árido para o reconhecimento nacional, mantendo suas raízes fincadas na terra que sua rosa desabrochou. E, portanto, se mantendo casto, inteiro, interiorano. Ganhou o mundo, sem se perder da sua aldeia, para onde voltou seu corpo e onde já estava enterrado seu umbigo.
Em vida, soube ser um declamador do seu tempo, tendo a coragem caririzeira de nadar contra as correntezas do mercado de sucessos fáceis. Na morte, continua gravado entre nós em canções tão plangentes quanto o pranto que nenhuma barragem da fama conseguiu represar. Um canto que foi e continua Vital. Ainda que o arco-íris já tenha mudado de cor.