Opinião: demissão de Caio, uma retaliação 'federal' – Heron Cid
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Opinião: demissão de Caio, uma retaliação ‘federal’

17 de junho de 2023 às 14h30 Por Heron Cid

Li a manchete no Portal MaisPB. Chequei em outros concorrentes. A curiosidade era para identificar a gravidade do crime cometido pelo “policial Caio”, ou “Caio da Federal”, para merecer desfecho da punição de uma sumária demissão, incomum no serviço público brasileiro, complacente com todo tipo de coisa.

Pergunto antes de continuar: você já viu por aí algum servidor público concursado ser exonerado, a não ser depois de anos de recursos e de ter cometido as piores atrocidades contra o erário?

Ao final da pesquisa sobre o processo, a constatação: Caio Márcio Ângelo de Sousa foi exonerado pelo ministro da Justiça, Flávio Dino, pelo uso indevido do cargo “com o fim, ostensivo ou velado, de obter proveito de natureza político-partidária, para si”. Argumento subjetivo e questionável para tão grave medida.

Pensei. Como agente de polícia com 26 anos de serviços, deve ter praticado extorsão ou corrupção, recebido propina, usado o cargo para perseguir e constranger adversários, revelado informações sigilosas de investigações ou armado operação para benefício próprio.

Não. Até onde se apura, o único “crime” foi ter usado a expressão “da Federal” como plataforma de pré-campanha. Advertido pelo Ministério Público Federal e Tribunal Regional Eleitoral, o agente passou a se valer do termo “policial Caio”.

Durante a campanha, um partidário fez um vídeo com a camisa contendo a expressão “Caio da Federal”, e o então candidato, inadvertidamente, repostou. Pronto. O MPF entendeu como reincidência, pediu e a Polícia Federal abriu processo administrativo, que culminou com parecer da Advocacia Geral da União e demissão pelo Ministério da Justiça. Nenhuma outra pena alternativa. Rua.

Se essa lógica prevalecer, milhares de candidatos, inclusive na Paraíba, não poderiam usar suas patentes como cartões de apresentação. Sargento Dênis ou Tenente Rebeca, por exemplo, são expressões que, implicitamente, os associam à Polícia Militar da Paraíba. É uso indevido da função?

Tenho divergências políticas com o policial escorraçado, e com ele já tive atritos até no campo profissional, mas ninguém precisa ter qualquer afinidade com o agente degolado para chegar a óbvia conclusão: bolsonarista contumaz, Caio está sendo alvo de explícita retaliação política pelo seu ostensivo apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

A punição é tão radical e ideológica quanto Caio. Alguém, de verdade, acha que seu destino seria a demissão se o frágil alegado “uso do cargo” tivesse sido de um apaixonado militante e empedernido cabo eleitoral da campanha de Lula? Um governo que se diz “antifascista” escolhe atitude típica de um Mussolini contra um adversário.

Quem hoje aplaude essa desproporcional pena, por mero prazer pessoal ou vingança política, autoriza, involuntariamente, semelhante arbitrariedade quando a roda gigante da política gira. Para denunciar uma injustiça contra alguém ninguém precisa pensar igual ou partilhar das mesmas convicções. Basta ter senso crítico e de justiça.

Aliás, no Brasil, há algum tempo, já não importa o quê. Depende de quem.

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