Nem tive tempo de me despedir. O leitor tem direito de reclamar, como fez João Silva, na famosa canção gravada por Luiz Gonzaga. Até tentei, mas não consegui. O turbilhão do antes e depois do dia 29 de junho de 2022 arrebatou todos os ensaios de uma palavra de adeus ou até logo.
Talvez “por força desse destino” que quis assim, uma página em aberto, um hiato entre a interrupção e a retomada. Que faço aqui e agora.
Não tenho a pretensão de em um só texto resumir o salto que dei nos mares agitados de uma eleição. E logo na mais paradigmática, turbulenta, radical e polarizada disputa dos últimos tempos brasileiros.
De tão ambientado com o frisson do cais político, desde a mais tenra idade, o autor do Blog rompeu a fronteira da observação crítica, como ofício profissional cotidiano, e lançou-se ao risco da navegação própria. Sem mapa, sem bússola e sem barco.
O que vi e vivi nos últimos seis meses – em especial no período tempestuoso da campanha – daria muito bem um livro (quem sabe!?). Partilharei episódios marcantes, lições definitivas e grandes aprendizados de fé, tudo em doses despretensiosas, ora entrelaçadas em análises, ora desfiadas em crônicas.
Já digo: foi uma faculdade em vida, uma pós em ser humano, um mestrado sobre cidadania e um doutorado nas contradições da política. Provei o lado amargo do jogo selvagem, cresci no necessário debate cidadão e me abasteci dos gestos de solidariedade, conhecidos e anônimos, tão comoventes quanto surpreendentes.
Uma experiência arrebatadora, instigante e tão saborosa que deixou gostinho na boca. Mas também desafiadora nos limites das forças e da mente. Só comparável, sem exageros, ao que vivem os náufragos. Na ilha desconhecida, todo dia uma descoberta diferente, uma fera a ser vencida, uma esperança a ser renovada, até, enfim, o resgate.
Sobrevivente, levo cicatrizes próprias dos que lutam com intensidade, paixão e senso de missão. Os sábios navegantes já dizem que mais importante do que a partida e a chegada é o percurso, e como nos portamos durante o caminho. As escolhas que são feitas. Ou o que se abdica.
Aqui estou, remando de volta e completando a caudalosa travessia com aquela sensação boa de terra à vista. Ao jornalismo, meu lar desde sempre, regresso de coração leve, cabeça erguida e sentindo no rosto o vento da liberdade de quem chega sem precisar bater na porta. Na nossa casa, a gente não pede licença para entrar.