A primeira rádio a gente não esquece (A Crônica de Domingo) – Heron Cid
Crônicas

A primeira rádio a gente não esquece (A Crônica de Domingo)

13 de fevereiro de 2022 às 18h01 Por Heron Cid
No estúdio da Mares FM: ao meu lado Jota Ferreira e na foto o entrevistado, professor Chiquinho Sicupira

Quando recebi o convite de Val Olímpio, na minha casa na Rua Ana Rocha, número 18, não levei muito a sério. Naqueles meados de 1998 e nos precoces 14 anos, achava aquela história muito distante da realidade da pequena Marizópolis.

Só acreditei de verdade quando “vi” com meus próprios ouvidos. Ao chegar da escola, no fim de tarde, de cima de nossa geladeira marrom na cozinha o rádio à pilha estava no último volume e a voz que irradiava era conhecida.

Com seus graves, Carlos Alexandre, da Voz Alternativa, emitia o princípio dos sinais da inauguração experimental. A novíssima estação ainda chiava com os ajustes no transmissor feitos ao vivo na tentativa de afinação do som e da sintonia.

Nunca soube ao certo como descrever a imediata sensação. Parecia extasiado olhando para o aparelho bem diante de mim. Era a primeira rádio da cidade nascendo e desafiando-me, um já apaixonado pelas ondas sonoras.

Mal deu tempo tomar banho e trocar de roupa. Domei a bicicleta, saltei fora na rua e corri para o endereço identificado: a sede da Atacam (Associação dos Trabalhadores em Arte Comércio e Agricultura de Marizópolis), organismo liderado pelo combativo Célio Macário, que misturava cooperativismo e núcleo político.

Lá, uma multidão já testemunhava o parto no interior do pequeno prédio. Do outro lado do vidro, equipamentos, microfones, fitas cassetes, mesa de som, telefone… Os primeiros e poucos CD’s se repetiam à exaustão na programação.

Não demoraria. Dias depois, estava lá, já na programação oficial, servindo diariamente de locutor musical do programa noturno (Maré Baixa). Menos de um mês depois, ancorava o Maré Alta, programa de semanal de jornalismo aos sábados.

Entre os entrevistados, o apresentador mais famoso de Sousa no momento, Ruy Dantas. Por um daqueles gestos de generosidade, e a pedido de minha mãe, dona Marizete, Ruy foi prestigiar um amador e –  por mero estímulo altruísta ou intuição – cometeu a ousadia de projetar algum futuro no moleque que se esforçava para entrevistar, com alguma competência, aquela ascendente estrela do rádio sousense.

Era a “Mares FM 92,9”. Como assim? Alguém quis homenagear Marizópolis sacando as primeiras sílabas do nome da cidade e nem ligou para o fato de o batismo em questão ser de uma emissora encravada em pleno árido sertão paraibano. Uma colisão entre semântica e geografia.

Achando pouco, a logomarca da rádio tinha inspiração tipicamente litorânea e exibia desenhos de azuis ondas marítimas, no lugar do presumido mandacaru. Sem questionar a contradição, subi no barco, soltei minhas velas e naveguei para uma travessia sem volta.

*Para o Dia Mundial do Rádio – 13.02

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