O disco “Meu Coco”, de Caetano Veloso, parece que ainda virá. As palavras de Caetano têm uma densidade difícil de esvaziar, por isso “Meu Coco”, precisa se fixar no “coco” da gente. Gatilhos mentais.
Em “Cobre” a oitava faixa, ele diz que vale a pena ter vivido e estar vivendo. É como se ele estivesse nascendo de novo. “Tua pele é um cobreado da Bahia de nós dois”. Para quem será?
Cada sílaba, cada verbo, cada signo, cada nome, são acertos, escritos ou cantados, num espaço de tempo que vem da semânticalegria, da densidade do homem Caetano, aparecendo como ele sempre foi, super moderno.
O sol nas bancas de revistas, se repete em meu “Meu Coco”, na canção “Ciclâmen do Líbano” – “teu sol-mel dulcíssimo”. Em “Cobre”, “sol das onze sobre o teu quase cobre que descobre que é o meu amor”. Sol que clareia meninos e meninas, amém.
O húmus, essa força para a vida, está na canção “Autoacalanto”, (a 5ª faixa) quando um ser consegue ninar a si mesmo, seu netoafeto e assim fomenta o nascimento de uma nova pessoa. Que amor de pessoa, o vovô Caetano!
“Meu Coco” traz a bunda da menina preta de biquíni amarelo e lá estamos nós e nossas bundas empinadas e caídas, com todas as dores dos furúnculos, câimbras e ínguas.
Somos ciganos, fulanos, pretos, índios, simones e raimundas, mamelucos, zumbis, izabés e um batuque, um batuque, um batuque. Sei não, é uma vertigem esse coco. E o melhor: Irene continua rindo. Benzadeus.
O melhor de todos os poros e arrepios, todas as almas, e corpos, a mais bela canção “Ciclâmen do Líbano”, (segunda faixa, onde passamos rapidamente pelos vales, paraísos, purgatórios e infernos de Alighieri). É a canção mais bonita. Eu choro e gozo sem sentir dor.
“Anjos Tronchos”, terceira faixa, é o que existe de mais moderno e cruel.
A quarta faixa “Não Vou Deixar” é a cara dele, do sentido de ele protestar, dos incontáveis não vou, não vou, não vou deixar, não vai, não vamos, não. O vovô é foda, quem quiser que aguente.
Pixinguinha em “GilGal”, sétima faixa, com Jorge Ben, Djavans e bem mais. Até o imenso Milton Nascimento, a voz mais bonita do Brasil.
Caetano e seus ais soltos num mundo mais feliz, com Bethânias, Naras e Elis, essa, nem precisa do plural.
Caetano dá luz a “Enzo Gabriel”, a sexta faixa, que já sabemos qual será seu papel e logo o menino descobrirá que na barriga da miséria, nasceu brasileiro.
O ruído eletrônico e o assombroso som de Jaques Morelenbaum, pratos e Morenos e não falta nada, tem alusão sobrando. Tudo está lá – são resquícios do que ainda estamos vivendo.
“Cobre” a oitava faixa é tão linda, que se transforma num amor que a gente esperava, com a saudade que agoniza, nos instantes nos mares, das cavernas, as crateras do presente, e lá longe, o pé de Araçá por onde passa o trem das cores.
“Meu Coco” que abre o disco, nos coloca diante de João Gilberto e quanto mais escutamos mais esquenta esse contato com átomos, áfricas, chineses e cocadas, até que vem um silêncio de pedra.
“Pardo” 9ª faixa, azul, preto, azeviche, cor de rosa, pétala, jasmim, orixás, homens, bichos e mulheres, sem cores, nem cores de burros quando fogem.
O fado “Você-você”, a décima faixa, é um sol prazeiroso, que chega no duo com a cantora portuguesa Carminho. Ele gosta tanto de fado…
Sambando a gente vai levando. Caetano olha para o Cristo no Corcovado, saúda os sertanejos, mas “Sem Samba Não Dá” (a 11ª faixa) e ainda grita: ”êpa Babá”. Tantas vozes nessa canção, cultura e civilização. o disco renova a fé e não é só um jeito de corpo, a gente tem que acompanhar.
“Noite de Cristal” fecha o disco, que ele fez para Bethânia cantar há 33 anos no álbum “Maria” de 1988.
Caetano está nu, com a cabeça solta e emana muitos prazeres em “Meu Coco”.
Kapetadas
1 – Lembre-se que ao ouvir Meu Coco, não seja impulsivo na hora de ser impulsiva.
2 – Será sempre da sua conta se sua intenção for ajudar a melhorar o Brasil.
3 – Som na caixa: “Nossas almas irmãs, rasgaram manhãs”, dele na canção GilGal
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