A humanidade está doente (por Milton Marques Jr.) – Heron Cid
Opinião

A humanidade está doente (por Milton Marques Jr.)

4 de julho de 2021 às 08h38 Por Heron Cid
Desabafo do governador Eduardo Leite criou mais uma "celeuma inútil", na visão do acadêmico Milton Marques Júnior

A humanidade está doente. E, no Brasil, estamos numa gravidade tal que não há unidade ou centro de terapia intensiva que dê jeito. Sobretudo, por se tratar de doença do espírito, que termina contaminado o corpo.

A atual e inútil polêmica a respeito de um governador que assumiu a sua homossexualidade, deu-me a certeza dessa doença. E outras mais vieram. Para os doentes, que pregam a diversidade, a liberdade de expressão e o respeito ao outro, não basta ser negro ou ser mulher ou ser homossexual. Há uma imposição para que o negro, a mulher e o homossexual sejam aqueles da idealização de quem faz patrulhamento ideológico. Ou seja, se for negro, mulher ou homossexual, só vale se também for de “esquerda”.

Mais uma vez, a “esquerda” se arvora em senhora da verdade, detentora do conhecimento e da probidade. O que não é verdade, há tantos canalhas e ignorantes na “esquerda”, quanto na direita ou no centro ou em cima ou embaixo ou do lado de dentro e do lado de fora. Os fatos recentes de nossa triste história republicana têm mostrado que probidade não é exatamente a virtude da política partidária.

Mostram ainda mais: os poderes constituídos estão podres – executivo, legislativo e judiciário –, e muito mais podre o chamado quarto poder, a imprensa. Ainda que existam pessoas honestas e decentes em todos eles, são gatos pingados que trabalham duro contra a maré de infâmia e de lama, que todos os dias se levanta e emporcalha a nossa nação. A diferença entre poder e podre é apenas uma questão de metátese.

Essa situação me faz lembrar e trazer à ordem do dia George Orwell, sempre erradamente citado pela “esquerda” prepotente e autoritária, quando o discurso de Orwell, em 1984 e em Revolução dos bichos, é exatamente antípoda ao que pensa e prega a “esquerda”. Em 1984, o cidadão não pode pensar por si só, além de a história ser constantemente refeita pelo Ministério da Verdade.

O cidadão tem que comprar um discurso feito, por mais incongruente que ele seja, e repeti-lo à exaustão, de modo a, com o tempo, passar a acreditar nele. O meio para se fazer isto é a criação da novilíngua, que todes (ironia, pessoal!) terão de usar.

Na novilíngua os conceitos mudam rapidamente, ao sabor do que desejam o partido e o Grande Irmão, que costumo chamar, para homenagear Nélson Rodrigues, de Sobrenatural de Almeida. Assim, morte é vida e vida é morte; liberdade é escravidão e escravidão é liberdade; guerra é paz e paz é guerra.

Para a comprovação disso é suficiente ver que um ser execrável, como um certo senador nordestino, cujo nome sequer deveria ser pronunciado, passou a ser o queridinho da “esquerda”… Por outro lado, todo o discurso de diversidade na unidade esconde, na realidade, a diversidade em fragmentação, colocando uns contra os outros e, numa atitude ditatorial, excluindo quem pensa diferente.

Voltando ao governador, que, sem querer, deu partida a mais uma celeuma inútil – do ponto de vista de que ser homo ou hetero nada diz da sua capacidade como administrador, devendo ser algo de estrito foro íntimo –, mas de grande utilidade para desmascarar as atitudes excludentes, discriminatórias, prepotentes e autoritárias de quem diz respeitar os outros, confundido respeito com concordância.

Posso não concordar com nada que alguém diga, mas respeito o que se diz, sem querer obrigar ninguém a pensar como eu. Digo mais, se for para discordar, discordarei da direita, da esquerda, do centro, de negro, de branco, de homo, de hetero, de rico, de pobre, de intelectual – o de que mais gosto –, de ignorantes, de políticos, de governo, de ídolos… Pela simples razão de que não sou obrigado a comprar discurso pronto de ninguém, nem agir como boneco de ventríloquo, repetindo o que o seu senhor, com a mão enfiado no seu traseiro, o manda repetir.

Volto também a Orwell, (foto) desta feita em Revolução dos bichos, para complementar a polêmica oca do caso do governador. Para os patrulhadores, gente sempre ressentida e amarga, doentes do espírito, todos são iguais perante a lei, mas sempre há alguém mais igual do que outros.

Infelizmente, o governador é daqueles iguais, visto de cima para baixo pelos mais iguais do que ele. Serei que serei excluído, mas não tem importância. A minha vida tem objetivos e sempre os persegui, ao contrário de muita gente, perdida, que anda sem ter para onde ir.

*Milton Marques Júnior é titular em Letras Clássicas, professor de Língua Latina, Literatura Latina e Literatura Grega da UFPB. Escritor, é membro da Academia Paraibana de Letras.

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