Renda cidadã não combina com mais impostos (por Maílson da Nóbrega) – Heron Cid
Bastidores

Renda cidadã não combina com mais impostos (por Maílson da Nóbrega)

11 de outubro de 2020 às 08h00 Por Heron Cid
Paulo Guedes discursa em cerimônia no Planalto | Adriano Machado/Reuters

Tem-se visto nos últimos dias análises de economistas e jornalistas, para os quais o governo poderia resolver, mediante elevação da carga tributária, o impasse em que se encontra o financiamento do programa Renda Cidadã. Há até quem aponte a fonte, que seria a CPMF. Na noite de segunda-feira, 5, após participar de jantar na residência oficial do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o senador Renan Calheiros (MDB-AL) defendeu medidas na área do Imposto de Renda para viabilizar o programa.

Acontece que aumentar impostos é uma saída ineficaz para o caso. Ela valeu por 28 anos, entre a Constituição de 1988 e a aprovação do teto de gastos pela emenda constitucional nº 95, em 2016. Antes, a solução para aumentar despesas, inclusive as decorrentes da própria Carta Magna, era elevar a carga tributária ou recorrer a aumento da dívida pública. Isso é passado.

Agora, a lógica é outra. O ajuste se dá pelo lado da despesa e não da receita. Assim, para viabilizar a cobertura dos gastos adicionais do Renda Cidadã, estimados em 30 bilhões de reais em 2021, será preciso efetuar cortes no Orçamento, visando a abrir o correspondente espaço orçamentário em favor do programa.

A saída racional, proposta pelo Ministério da Economia, é reduzir ou eliminar programas sociais menos eficazes e mal focalizados. Seriam os casos, como vimos, do abono salarial, do salário família e do seguro defeso. Acontece que o presidente Jair Bolsonaro, que deseja o bônus popular do programa, mas não o ônus político da redução de outros gastos, rejeitou liminarmente a ideia.

Poderia haver uma surpresa. O ministro Paulo Guedes e o senador Márcio Bittar obrariam um milagre, apontando a saída que ninguém encontrou até agora, sem recorrer a barbaridades como a de dar um calote nos detentores de crédito derivados de precatórios.

Se a solução miraculosa não aparecer, existem duas outras saídas;

1. Bolsonaro recuar, aceitando a proposta original de seu ministro da Economia. Seria a melhor saída;

2. O governo propor a flexibilização do teto de gasto, considerando isento do limite o programa Renda Cidadã. Seria a pior saída.

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De fato, ao quebrar a âncora fiscal, que é o teto, o Congresso provavelmente introduziria outras exceções. O país poderia caminhar rapidamente para a insustentabilidade da dívida pública, o que provocaria queda de confiança, depreciação cambial, inflação, aumento de juros, redução do potencial de crescimento do PIB, da renda e do emprego. A pobreza e a desigualdade aumentariam.

Se pensar apenas na eleição, Bolsonaro optaria pela flexibilização. O efeito político poderia ser, todavia, o oposto do que ela almeja. Em vez de aumento de popularidade, colheria o ambiente que tornaria inviável seu projeto de reeleger-se em 2022.

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