Comprar um presente para a mulher amada, por exemplo, um brinco de safira, um perfume francês, uma lingerie dourada (foto), um oratório de cedro ou um livro de Wirgínia Woolf, não tem nada a ver com sexo, mas tem tudo a ver com erotismo.
Sexo é experiência do determinismo e da factualidade, fisiologia pura; erotismo é mergulhar na liberdade, na transcendência e na imaginação. O sexo nos deixa em paz organicamente enquanto o erotismo nos inquieta, nos atiça a libido, a sensibilidade e a fantasia. Com o sexo, somos instintivos, animais; com o erotismo, somos vontade, somos humanos.
O fluxo da sexualidade é limitado: satisfeito o desejo, vem a saciedade, e, não raro, o enjoo e o tédio… No erotismo, não: seu fluxo não tem limites, é uma aventura permanentemente em aberto como a estrutura das autênticas obras de arte.
Sexo é natureza; erotismo é cultura. Sua lógica é, pois, cultivar, cultivar o corpo, com seus dons orgásticos, seus derivados de delícia, e cultivar a alma, com seus signos constelados e suas aspirais de amor. Pelo sexo, vejo apenas a mulher, a fêmea, o animal; pelo erotismo, vejo também a mulher, a fêmea, o animal, mas, sobretudo, vejo a pele do poema, seus sinais translúcidos de imagem e melodia, uma linguagem toda feita de luz e umidade.
O sexo esbarra na possibilidade de olhar e apalpar as coisas em sua esterilidade nua, em sua natureza bruta e fatal; o erotismo, ao contrário, intensifica e amplia o nosso olhar, transmutando as coisas em objetos mágicos de desejo.
A expressão “fazer sexo”, portanto, é um equívoco semântico. O fazer humano – sabe-se- é uma práxis, isto é, ação pensada, projetada e realizada com finalidades especificas. Daí, a impropriedade da expressão.
O sexo é uma mera pulsação, uma necessidade biológica, uma atividade cega. O erotismo, em contrapartida, é um fazer. Mais que um fazer, é um tecer, um costurar, um construir, um imaginar, um criar, fundado num ethos que desencadeia a correnteza do prazer. Erotismo é cerimônia de comunhão, uma espécie de eucaristia onde carne e espírito se fundem no milagre da epifania.
Finalmente, se provarmos apenas do tempero invariável do sexo, do sexo pelo sexo, não ultrapassaremos a condição fechada e genesíaca dos primatas; se liberarmos, não obstante, nossa energia erótica, explorando as inúmeras receitas deste cardápio sagrado, nos aproximaremos de algum lugar em que vibram os alaúdes de Deus.
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