A inexistência de oposição ativa no Brasil atinge a maioridade em outubro, quando se completam dezoito anos que o PT ganhou a Presidência da República e virou situação. De lá para cá foi se enterrando a atividade oposicionista conduzida pelos partidos e entendida como tarefa que implica a adoção de estratégias claras, táticas eficazes, consistência de discursos, nitidez de propostas e atuação assertiva de lideranças com identificação em um ou mais grupos sociais.
O que temos hoje é uma gritaria de internet de um lado, onde a agressividade assume o lugar da assertividade levando à perda de consistência, e de outro a atuação das instituições em reação a abusos de poder, coisa que não deveria, mas acaba sendo confundida com exercício de oposição. Há posicionamentos importantes de personalidades e entidades, mas sem organização partidária por trás tais manifestações resultam em dispersão de esforços.
Um resquício de vida útil no ofício saudável do contraditório ainda permaneceu enquanto vigorou a dicotomia PT-PSDB, extinta por vários motivos, entre os quais destaca-se a fadiga de material, que acabaram resultando na percepção do eleitorado de que a escolha de alguém fora do mapa da normalidade seria a solução para o país.
O exemplo de 1989, quando havia 22 candidaturas e várias de boa qualidade, mas a maioria preferiu optar pela invencionice à deriva, não foi suficiente para evitar a repetição do equívoco.
Pois estamos agora numa situação bem pior. Multiplicaram-se os partidos, enquanto se reduziu o cardápio de nomes à disposição. Onde havia Mario Covas, Leonel Brizola, Roberto Freire, Ulysses Guimarães, Luiz Inácio da Silva, Fernando Gabeira, da esquerda ao centro, e Ronaldo Caiado, Afif Domingos, Aureliano Chaves e Paulo Maluf, nem todos bons, mas com representatividade nos respectivos quadrados, hoje não há quase nada além de pálidos ensaios.
A distância que nos separa da próxima eleição presidencial não justifica a modorra exibida pelos partidos, assemelhados a bichos-preguiça no completo alheamento em relação à sociedade. Alegam que este não é o momento ideal para atuarem. Pensamento típico de quem enxerga o exercício da democracia pela óptica exclusivamente eleitoral. Revela uma visão utilitária da população. Esta, por sua vez, se mostra bastante pragmática: responde a quem a instiga e destina indiferença a quem só indiferença lhe oferece.
É de se perguntar como os partidos e/ou pretendentes a candidatos imaginam ganhar a eleição sem cultivar o eleitorado na entressafra. Jair Bolsonaro fez isso, cevando seu público ao longo do tempo para dar o bote final (candidatura à Presidência) quando as condições se apresentaram propícias e havia todo um terreno de ressentimentos a ser trabalhado para a colheita.
Em outra moldura e com a vantagem da posse dos instrumentos de poder, Bolsonaro reedita a dinâmica do cultivo adaptando comportamentos, apropriando-se de bandeiras alheias, jogando várias casas à frente ao começar a percorrer o país às vésperas da eleição municipal. Faz um ensaio geral, planta as sementes nos municípios sem necessariamente dizer que a ideia é investir nos ganhos locais para aumentar seu patrimônio em âmbito nacional.
E o que fazem os adversários? Simulam desdém, a fim de marcar superioridade, olham os resultados das pesquisas com inconformidade improdutiva, apostam que os efeitos do assistencialismo serão transitórios (a despeito de o PT já ter dado uma lição sobre isso) e continuam a acreditar na eficácia da denúncia do “fascismo” , em vez de lançar mãos à obra para demonstrar que Jair Bolsonaro simplesmente não sabe governar.
Embora trate-se de um presidente desprovido de projeto para o país, ele conta com a vantagem de ter oponentes que padecem do mesmo mal. Qual é o plano do PT, do MDB, do PSDB, do DEM ou de qualquer outra agremiação que pretenda se contrapor a Bolsonaro em 2022?
Até agora não se ouviu nada que pudesse fazer a população reconhecer como boa alternativa “a isso tudo que está aí”. Chamar Rodrigo Maia de covarde e reclamar que ele não dá prosseguimento aos inúmeros pedidos de impeachment apresentados à Câmara não guarda semelhança alguma com um programa de boas soluções para os problemas do Brasil.
A esse tipo de atitude dá-se o nome de acomodação. Também conhecida como medo do trabalho, incapacidade real de reação, inaptidão para a boa e inteligível comunicação. Ou, em duas palavras, incompetência e indolência.
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