Rubens Nóbrega, nosso ás do jornalismo, em uma crônica inspirada, foi quem melhor definiu você, Adelson Barbosa dos Santos Filho. E depois que Rubens Nóbrega escreve, como se diz na Bíblia, “está escrito”.
Meu caro, sim hoje sou eu quem tomo por empréstimo essa toda sua peculiar forma de tratamento para falar de sua passagem. Para dizer, como nosso dom Rubens, que fostes exemplo de repórter na essência. Um apaixonado e autêntico desbravador da reportagem, o gênero que – nutrido no seu DNA – teceu as fibras da sua presença destacada na imprensa.
Um profissional tão visceral que não procurava apenas uma matéria, prospectava histórias. Não se contentava com o texto, farejava a manchete.
Já nos estertores do Correio da Paraíba e na agonia da sua luta pessoal contra a doença que te consumia, quantas vezes me confessastes que bastaria liberdade, um carro e hospedagem para rodar essa Paraíba e toda semana voltar com grandes histórias e temas para imprimir nas páginas do jornal.
Eu sei, meu caro, que já na edição final de sua existência faltava paciência para conviver com a cama que limitou a sua natureza hiperativa, a mesma inquietude que te moveu da adolescência muito pobre de Patos para – pela força da persistência, conhecimento e graduação em Jornalismo – conquistar o seu lugar ao sol na capital que te pariu, por acidente, numa marinete às margens da emblemática Lagoa.
Por isso, nas tuas últimas páginas, lançavas mão ao telefone e disparava ligações para os amigos. Na derradeira entre nós, foram quase duas horas. Ao final, entendi porque os assuntos já haviam esgotado e o telefonema se prolongara tanto. Era sua tentativa de reviver os amigos e o jornalismo, aquele ambiente para o qual você viveu intensamente e com todas as energias de trabalho exaustivo e incansável.
Já fora do batente, aguentou firme e só deu o último suspiro três meses depois da morte do Correio da Paraíba, que mereceu toda sua abnegação e força de trabalho. Sei quanto aquele desfecho mexeu com suas reminiscências e memórias afetivas. Quando a luz da redação apagou, o alto som das tuas audições de Luiz Gonzaga, com a Feira de Caruaru, Kalu e tantas outras que rompiam o barulho daquelas tardes e noites de fechamento de jornal, também calou.
Não antes de ter conquistado seu pedaço de terra, como todo sertanejo sonha. Aquela casinha de campo de que fala Zé Rodrix e Elis. O lugarzinho à beira do desertificado Rio Paraíba, para onde se mandava nos poucos dias de folga, se distraía, plantava, colhia e ainda semeava entre amigos.
Ao te ver fisicamente inerte, veio-me à mente a espiritual e sempre viva impetuosa vitalidade, caricaturada no sesto de esmurrar a própria coxa para dissipar a indisfarçável hiperatividade. As lembranças de tantos gestos solidários e desprovidos de qualquer expectativa de reciprocidade a um recém-egresso do Sertão e do jornalismo, que nada – nada – tinha a retribuir. Talvez você, de alguma forma, identificava no seu passado aquele rapazinho sem lenço e sem documento.
Naquela plangente hora de ontem, agradeci a Deus, em quem você sisudamente cria, por estar vivo e testemunhar – no dia da sua despedida – ao seu redor, sua companheira de vida Lúcia, sua filhas Maria Eduarda e Renata e seu filho Dênis. As presenças que você – confessadamente – sempre se esforçou para juntar na mesma imagem. A cena que, como notícia ensolarada no meu dia cinza, soube que tivestes a felicidade de ver como presente dos dias últimos.
Sua vida, sua luta, valeram à pena, meu caro. A ti, devo muito mais do que este singelo texto.