A vida é feita de escolhas. A política também. Em 2018, entre a cruz e a espada, o Brasil fez a sua e optou por eleger Jair Bolsonaro, aquele que melhor soube catalisar o sentimento de mudança e cansaço com a avassaladora corrupção que sacudiu o país nos últimos anos.
Antes, Sérgio Moro, juiz de Curitiba, desde 2014, escolheu pagar o preço e se insurgir contra um sistema jurídico e político arraigado de longas datas, sabendo das grandes chances de esbarrar em reações organizadas das cúpulas.
Eleito, Bolsonaro escolheu esse mesmo Sérgio Moro, o símbolo da Lava Jato, para comandar o super Ministério da Justiça e da Segurança Pública com “carta branca”. Era o coroamento das massas que esperavam ver no governo o que elas depositaram nas urnas.
Magistrado há 22 anos, Moro escolheu. Largou o conforto de herói e tomou a decisão política de associar seu nome a um governo, a um presidente, a um político, certamente crente de que essa seria sua chance pessoal de implementar uma legislação e uma política pública mais arrojada contra o crime organizado.
No decorrer do atual governo, Bolsonaro e Moro entraram em descompasso, em várias situações. Muitas das propostas do ministro foram deformadas no Congresso, com reações tímidas ou até o endosso do presidente. O distanciamento entre discurso e prática foi aumentando.
Foram várias situações de desconforto público. Sérgio Moro foi administrando e já tinha o mesmo tamanho de quando entrou pela primeira vez na Esplanada. A desidratação entrou em progresso.
A cabeça de Moro já vinha sendo pedida pelas cúpulas políticas, abertamente desconfortáveis com o clima jurídico-policial implantando pela pedagogia pregada por Moro e que fez discípulos pelo Ministério Público Brasil afora.
Nas últimas horas, Bolsonaro – no epicentro da crise política que enfrenta em meio à pandemia do coronavírus – escolheu deflagrar tratativas com dirigentes e líderes partidários do Congresso, e especialmente com setores da política que publicamente marginaliza, diante de seus ativos militantes.
Sérgio Moro viu a luz amarela da interferência política na Polícia Federal e no compromisso de “carta branca” acenderem e resistiu. O presidente optou por seguir adiante e demitir o diretor-geral da PF, Maurício Valeixo, sem uma justificativa plausível e técnica.
Bolsonaro fez sua escolha, num grande e explícito aceno aos que se opõem ao estilo de investigação implantado por Moro. Ganhou de cara presumidos apoios no Congresso, o que lhe garante força para afugentar fantasmas do impeachment, mesmo sob o risco da perda do verniz conceitual do seu governo.
Sérgio Moro também fez a sua. Deixou o governo numa demonstração de que sua escolha no final de 2018 não foi por um emprego, um cargo público e nem por um apoio incondicional. No meio dos dois, o Brasil passa agora a ser instado a igualmente fazer uma escolha. Entre o ‘mito’ e realidade.