Seis horas sem ir ao banheiro e sem tomar água. Esse é apenas um dos desafios que médicos intensivistas enfrentam no principal front contra a covid-19 na Paraíba, a Unidade de Terapia Intensiva do Hospital Clementino Fraga, em João Pessoa.
Na UTI, vestidos de equipamentos de proteção individual (EPI), os profissionais só podem retirar as roupas especiais após o fim do expediente, razão pela qual os plantões não passam das seis horas.
O Blog obteve o relato exclusivo de um dos 30 médicos da equipe, que se reveza dia-dia para tratar de pacientes suspeitos da doença. Um, já confirmado, morreu ontem à tarde.
A letalidade e evolução do novo coronavírus impressionam até a Medicina. “A agressividade é surpreendente. Em anos de experiência, nunca vi nada parecido com a força da destruição dentro do organismo”, contou.
“Os pacientes já chegam graves, muitas vezes conversando, mas em poucas horas pioram ou são entubados e colocados em ventilação mecânica”, relatou.
E prosseguiu: “Pessoas jovens pedem para não morrer, quando chegam. O vírus é mais rápido do que nós. Ele evolui com um cansaço intenso que se torna doença respiratória aguda e causa pneumonia. Muitas vezes acrescenta uma infecção bacteriana. Os rins se fecham e precisa de diálise. A secreção pulmonar fica espessa e se torna difícil a ventilação dos pulmões até com ventilador mecânico”.
A equipe do Clementino Fraga segue o protocolo internacional e administra hidroxicloroquina, azitromicina, tamiflu e teicoplanina no tratamento dos pacientes com suspeitas do vírus.
Como tem sido entre vocês médicos o efeito psicológico dessa doença?
Para esta pergunta do autor do Blog, uma resposta forte: “Também estamos devastados. Muitos até desistem de estar na linha de frente, por diversos medos. É realmente um voluntariado. É seguir o juramento e pedir força a Deus”.
A rotina mudou completamente. Com identidade preservada, o médico autor desse relato ao Blog conta que desde quando entrou na equipe ainda não voltou para sua casa. Apesar de confiar no rigor do padrão e na segurança da EPI, ele prefere evitar o contato com familiares.
Quando sai do hospital, vai a um apartamento onde fica sozinho. “Eu me sinto seguro contra o vírus, mas também quero proteger minha família. É do trabalho para o isolamento”.
Isolamento, a palavra que resume esse momento. Muito parecida com desolamento.