O governo perdeu tempo namorando uma saída mágica. Com a nova CPMF seria possível reduzir, ou até eliminar, a contribuição previdenciária patronal, e isso, pelo menos na prancheta, criaria emprego. Era um plano com dois alvos: o novo imposto seria parte da reforma tributária e criaria uma política pró-emprego. Agora, o Ministério da Economia está olhando para outros impostos. O primeiro da fila é a taxação de dividendos. Há dois problemas: não arrecada o suficiente para desonerar a folha e teria como compensação a redução do IRPJ.
A proposta de taxar dividendos começou na esquerda, e depois passou a integrar vários programas de candidatos. A tese é de que no Brasil a empresa paga muito imposto, mas o acionista tem isenção. Por isso, os economistas dos candidatos defenderam taxar lucros e dividendos, para deslocar o peso tributário da empresa para os donos ou acionistas da empresa, e assim haveria redução do IRPJ. Se o imposto for criado para cobrir parte da contribuição patronal, o IRPJ ficará alto. Há outras ideias, todas de baixa potência, como taxar os fundos exclusivos. Isso foi tentado pelo ex-presidente Michel Temer, era uma boa ideia, mas foi derrubada pelo Congresso. Na época se calculava uma arrecadação de R$ 6 bilhões, agora fala-se de R$ 10 bilhões. Nada significativo. Mesmo somando-se com uma estimativa R$ 24 bilhões no imposto sobre dividendos, ficaria anos-luz do necessário. O ministro Paulo Guedes falava em R$ 150 bilhões a arrecadação possível com a CPMF. A contribuição patronal para o INSS rende cerca de R$ 200 bilhões por ano ao governo.
O ministro Paulo Guedes afirmou durante a campanha que iria atacar isenções e subsídios ao capital que chegam a R$ 330 bilhões. Até agora, nada aconteceu. É mais fácil falar do que fazer. Um gasto tributário é com o Simples, outro é com a Zona Franca de Manaus. É uma coleção de vespeiros. O governo passou então a falar em acabar com deduções de pessoa física com médico e com educação, e com a isenção de pessoa com doença grave. Vai acabar atingindo só a classe média.
No Congresso apareceu uma tábua de salvação, que o governo olha com cada vez mais interesse. Uma PEC apresentada pelo deputado Pedro Paulo (DEM-RJ) está na CCJ e quando for para Comissão Especial o relator será o deputado Felipe Rigoni (PSB-ES). Eu o entrevistei junto com o deputado Enio Verri (PT-PR).
— Esta PEC fala o seguinte: uma vez violada a regra de ouro, que proíbe pegar empréstimos para pagar despesa corrente, vários gatilhos são acionados. Reduz em 10% os subsídios tributários, desvincula uma série de fundos que têm mais de R$ 260 bilhões, que podem ser usados para abater dívida ou para investimento, reduz a alíquota do Sistema S e aumenta a que vai para a Previdência. Permite a redução de jornada de servidores com redução de salário — explica Rigoni.
Verri alerta que o Estado precisa dos seus funcionários para servir à população e que o próprio Paulo Guedes diz que em cinco anos 40% dos servidores vão se aposentar. O ajuste seria feito naturalmente. A redução da jornada e salário de servidores foi considerada inconstitucional pelo STF, mas Rigoni explica que se a PEC for aprovada a situação muda.
Em entrevista à CBN ontem, o secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, disse que a carga tributária não pode diminuir de maneira alguma, e que inevitavelmente é preciso olhar para as despesas obrigatórias. Desde 2016, quando o teto de gastos foi aprovado, elas cresceram mais de R$ 200 bilhões, enquanto o investimento caiu de R$ 76 bilhões para os R$ 19 bi previstos para 2020.
Ele acha que é preciso fazer “a interlocução com o Congresso” para entre outras coisas discutir a folha de pessoal. Mansueto disse ser contra demissão de funcionário ou fim da estabilidade. Mas acha que é possível não reajustar os salários e suspender as progressões automáticas. Um técnico do Tesouro entra ganhando R$ 19 mil, e a progressão é tão rápida que, se tiver passado no concurso logo após a faculdade, aos 35 anos ele já chegou ao topo da carreira ganhando R$ 27 mil. “Isso não é eficiente”, diz ele.
Há muito a fazer para organizar o Estado brasileiro. Mas parte do governo fica caçando bruxas, parte fica imaginando uma saída fácil. Como lembra Mansueto, em contas públicas não há mágica.
O Globo