Um dos dois nomes que o ministro Paulo Guedes sugeriu para Joaquim Levy nomear para a diretoria foi exatamente o de Gustavo Montezano. Levy não quis nomeá-lo e agora é ele que vai assumir a presidência. A expectativa na área econômica é que o futuro presidente do banco, por estar integrado à equipe desde a época da campanha, possa acelerar o programa de privatização e de venda de ativos. Montezano assumirá um banco em crise, que teve quatro presidentes em três anos e seu nome foi anunciado no dia da recuperação judicial da Odebrecht, a maior da história do país e um dos mamúticos problemas a enfrentar.
Só a Atvos deve ao BNDES R$ 4 bilhões. Na Odebrecht são outros R$ 7 bilhões, com poucas garantias. Além de R$ 3 bilhões que estão fora da recuperação judicial, na chamada dívida extraconcursal. O pedido atinge a holding, mas não a Braskem, nem a construtora. O BNDES é o maior credor da Odebrecht. Montezano, que já foi do BTG, terá também que superar o ambiente de crise interna no banco provocado pela maneira grosseira como o presidente Jair Bolsonaro detonou o processo que afastou Levy.
O caso Odebrecht mostra as diversas crises do Brasil dos últimos anos. A corrupção, e a perda da reputação provocada por ela, a diversificação sem controle da empresa estimulada por empréstimos do governo, as frustrações com a queda de consumo pela recessão brasileira. Tudo junto levou a Odebrecht a vergar sob o peso dos R$ 80 bilhões de dívida. Na recuperação judicial estão R$ 51 bilhões. Os maiores credores são bancos públicos: BNDES, Caixa e Banco do Brasil.
A história do dia de ontem, em que a holding da Odebrecht pediu recuperação judicial, começou há muito tempo. A maior empreiteira do Brasil se afundou num lamaçal sem fim, financiando políticos de diversos partidos, principalmente do PT, que estava no poder. O grupo, já na terceira geração da família, decidiu escalar a corrupção criando até um bizarro departamento de propinas. Os crimes foram investigados, confessados e punidos na Operação Lava-Jato.
Além disso, o grupo fez algumas apostas que pareciam certas para quem acreditava que o Brasil continuaria a crescer. De 2010 a 2015, investiu fortemente no setor de etanol. Houve cinco anos de congelamento dos preços da gasolina, abatendo as empresas do setor. Comprou o aeroporto do Galeão, pagando um enorme prêmio, e o número de passageiros caiu. Investiu em concessão de estradas, e deu errado. Investiu em estaleiro para sondas para a Sete Brasil e fracassou. Nos últimos anos ela fez um enorme esforço para se ajustar, reduziu de 180 mil para 48 mil o número de funcionários. Mudou a conduta e as formas de controle. É a única empresa, das envolvidas na Lava-Jato, que aceitou ser auditada por procuradores americanos durante três anos. Tentava organizar suas dívidas, mas a Caixa a executou, depois que a LyondellBasell decidiu não comprar mais a Braskem. Ficou sem saída e ontem ajuizou o pedido de proteção judicial. No comunicado ao mercado, ela culpa a crise econômica que frustrou investimentos, e o “impacto reputacional dos erros cometidos”.
Num país em crise, com uma empresa dessa dimensão entrando em recuperação judicial, o BNDES, seu maior credor, passa a ter um novo e jovem presidente. Esse é apenas um dos muitos desafios que aguardam Gustavo Montezano. Na época da campanha, ele se ofereceu para trabalhar na preparação do programa. Depois de não ter sido aceito por Levy para a diretoria de privatização, foi trabalhar com o secretário de Desestatização Salim Mattar. Outro indicado por Paulo Guedes para Levy foi Fábio Abrão, para a diretoria de infraestrutura. Levy não quis, ficou com Mattar. Mas nada aconteceu na Secretaria de Desestatização. No governo, culpa-se a falta de integração do BNDES no processo, porque sem o banco a secretaria estaria sem a ferramenta mais importante. No BNDES, a informação é que não há lentidão, mas sim prudência, e que tudo tem sido preparado em negociação com o TCU. Na equipe econômica, o que se diz é que o BNDES não caminhava no ritmo adequado, e que agora tudo será acelerado. Na economia brasileira não há dia sem emoção.
O Globo