Durante a campanha eleitoral o general Hamilton Mourão falava em “autogolpe”. Pouco depois da vitória de Jair Bolsonaro, seu ministro da Economia sonhava com uma “prensa” no Congresso. Há pouco, o doutor Paulo Guedes queixou-se de uma imprensa “a fim só de bagunçar” e de uma oposição que quer “tumultuar, explodir e correr o risco de um confronto sério”. Quem ouviu a rua no domingo sabe que o sujeito oculto, e às vezes explícito, dos discursos e cartazes era a hostilidade ao Congresso. Esse é o nome do golpismo.
Nem todas as 58 milhões de pessoas que votaram em Jair Bolsonaro eram golpistas, mas todos os golpistas votaram no capitão. Passados cinco meses, a banda golpista encolheu na rua e no andar de cima. Como o sapo de Guimarães Rosa, não fez isso por boniteza, mas por precisão. Mesmo assim, escalou-se o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, para o papel de Pixuleco da vez.
De boa-fé, o mais ardente dos bolsonaristas haverá de reconhecer que Maia defende a reforma da Previdência há mais tempo e com mais ardor que Bolsonaro. O golpismo está sem ideias.
Tome-se o caso da reforma. Os dois pontos mais contestados são as mudanças no benefício aos miseráveis e a proposta do regime de capitalização. Paulo Guedes já disse que a primeira mudança poderá ser opcional e a segunda, além de opcional, poderá ficar para mais tarde. Admitindo-se que se crie um regime de capitalização opcional para quem entra no mercado de trabalho e que o cidadão possa optar por um fundo do Banco do Brasil ou da Caixa Econômica, onde está o problema?
A balbúrdia que ronda a reforma e outras iniciativas do governo não é alimentada por uma oposição tumultuante e explosiva. Ela vem de dentro de um governo desconexo onde brilha quem aposta no tumulto.
Bolsonaro tem quatro cavaleiros do Apocalipse. São os ministros Abraham Weintraub (Educação), Ernesto Araújo (Relações Exteriores), Ricardo Salles (Ambiente) e Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos). Basta compará-los a quatro ilhas de tranquilidade: Tereza Cristina (Agricultura), Tarcísio Gomes de Freitas (Infraestrutura), Bento Albuquerque (Minas e Energia) e Santos Cruz (Secretaria de Governo).
Weintraub foi a espoleta que explodiu a crise nas universidades. Sintomaticamente, enquanto ele jogava gasolina, Bolsonaro comportou-se como bombeiro. Aceitou a lista tríplice da Federal do Rio de Janeiro e nomeou a professora Denise Pires de Carvalho para sua reitoria. Pouco depois, mostrou-se contrário à cobrança de anuidades nas universidades públicas. Coisa de comunista, diria um golpista.
Ernesto Araújo meteu-se na armação de um golpe perfumado na Venezuela, Ricardo Salles encrencou-se com os financiadores internacionais do Fundo Amazônia e chamuscou a biografia de Joaquim Levy, presidente do BNDES, arrancando-lhe o afastamento da chefe do departamento de Meio Ambiente. Já a doutora Damares descobriu que Chico Buarque é um cantor.
Os cavaleiros do Apocalipse estragam o serviço de ministros que trabalham sem bumbo: Tereza Cristina costurou uma trégua com a China (Deve-se a ela o apoio do Brasil ao candidato chinês para a direção da FAO.); Tarcísio Gomes de Freitas dá nó em pingo-d’água negociando leilões e concessões; já o ministro de Minas e Energia cresce mantendo-se longe de debates inúteis.
No meio, está o Posto Ipiranga. Ainda não começou a vender berinjelas, e suas bagunçadas palestras são certamente um fator de desânimo para o empresariado. Ele ameaça ir embora do Brasil. Ninguém quer saber para onde vai. O que interessa é saber o que ele tem a oferecer, em 2019, para 13 milhões de desempregados. “Confronto sério” não gera emprego.