Um bom exemplo da impossibilidade de o Supremo Tribunal Federal (STF) participar de um pacto político com o Executivo e o Legislativo é o julgamento de hoje das liminares que impedem a privatização de estatais e suas subsidiárias.
Duas medidas correlatas foram tomadas monocraticamente por ministros, afetando as privatizações, cujo programa está em curso e é um dos pilares das reformas econômicas do governo.
A decisão do plenário do Supremo pode gerar reação do Congresso, que já tem um projeto para impedir que ministros possam tomar decisões individuais.
Estudos como “O Supremo em números”, realizados pela Fundação Getulio Vargas do Rio, mostram que o fenômeno da “monocratização” das decisões, decorrência do enorme número de processos que impossibilita que todos sejam julgados pelo plenário, vem prejudicando a atuação regular do STF.
Nada menos que 80% das decisões atualmente são monocráticas. Para o jurista Joaquim Falcão, criador do projeto da FGV, este fato ”deturpa o sistema, já que a Constituição dá o direito ao cidadão ser julgado pela instituição do Supremo, não por este ou aquele ministro”.
Nesses casos que serão julgados hoje pelo plenário, dois ministros interromperam um programa de desinvestimento da Petrobras, com possíveis efeitos colaterais no programa de privatização do governo, se as decisões forem aprovadas pela maioria.
O ministro Ricardo Lewandowski deu uma liminar em junho do ano passado proibindo a venda do controle de estatais e suas subsidiárias, inclusive da Petrobras, sem a prévia autorização do Congresso.
Essa decisão, se referendada pelo plenário, acrescentará à insegurança jurídica a demora do processo de privatização, pois a tramitação no Congresso necessariamente será demorada, e sujeita a injunções politicas de todas as ordens.
Dentro do mesmo entendimento, Lewandowski, em abril, encaminhou uma reclamação de sindicatos para proibir as privatizações de refinarias da Petrobras, que o ministro Edson Fachin acatou, suspendendo decisão do Superior Tribunal de Justiça que permitiu a venda de 90% das ações da Transportadora Associada de Gás (TAG), subsidiária da Petrobras, alegando que ela só poderia ser feita através de licitação.
As duas decisões monocráticas têm o efeito de paralisar o programa de venda de ativos da Petrobras, e podem dar à estatal um prejuízo de cerca de U$ 30 bilhões, além de já terem gerado uma insegurança jurídica que pode afetar o programa de privatizações do governo, que tem o potencial de gerar até R$ 1 trilhão.
Além dos impactos econômicos imediatos nos resultados da Petrobras, e a ingerência nos planos de privatização do governo, as decisões monocráticas, aumentando a insegurança jurídica, poderão afetar os investimentos aguardados para a retomada do crescimento econômico.
A definição de que estatais só podem ser vendidas com a autorização do Congresso, e de que as subsidiárias têm que ser vendidas através de licitações, e não do programa especial que a Petrobras utiliza, com autorização legal e o aval do Superior Tribunal de Justiça (STJ), afeta a economia como um todo, especialmente no momento crucial que estamos vivendo.
Parece incoerente a especialistas que, se a Petrobras pode criar empresas, subsidiárias, coligadas, da mesma forma não possa aliená-las, extingui-las, incorpora-las. Trata-se de ato de gestão da empresa, que tem órgãos de direção que, em tese, sabem o que é melhor da ela.
O programa de desinvestimento de ativos está em andamento desde o governo Temer, quando Pedro Parente assumiu a presidência de uma estatal quebrada e começou seu processo de recuperação.
Outra questão preocupante é o ritmo do Supremo, que hoje, em tese, vai apenas decidir se referenda ou não a decisão do ministro Lewandowski. O mérito da questão ficaria para outro julgamento, sem data marcada. Se não houver a decisão de queimar etapas e transformar a sessão de hoje em exame do mérito, continuará a insegurança jurídica na dependência da pauta do Supremo.