De doido para doido (por Helena Chagas) – Heron Cid
Bastidores

De doido para doido (por Helena Chagas)

30 de maio de 2019 às 13h00 Por Heron Cid
Presidente da República, Jair Bolsonaro, durante café da manhã com Dias Toffoli, Presidente do Supremo Tribunal Federal; Davi Alcolumbre, Presidente do Senado Federal; Rodrigo Maia, Presidente da Câmara dos Deputados; Onyx Lorenzoni, Ministro-Chefe da Casa Civil da Presidência da República; Paulo Guedes, Ministro de Estado da Economia, e Augusto Heleno, Ministro-Chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República - 28/05/2019 (Marcos Corrêa/PR)
Com doido não se discute, ainda mais quando o doido foi eleito, tem ainda capacidade de levar um monte de gente para a rua e – mais perigoso ainda – tem nas mãos uma caneta cheia de tinta. O principal, nesses casos, é evitar um surto violento. Então, vai-se concordando com o que o sujeito diz e levando as coisas. Mas é óbvio que não dá para levar o dito a sério, porque em breve ele passa a ser o não dito.

Essa foi a lógica do ameno café-da-manhã que reuniu no Alvorada, dois dias depois dos protestos de domingo, os presidentes dos poderes da República. Em torno de Jair Bolsonaro, sentaram-se os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, um dos principais alvos dos manifestantes bolsonaristas, o do Senado, Davi Alcolumbre, e o do STF, Dias Toffoli, que também apanhou dessa turma.

Na linha do “ei, tenho uma ideia”, Toffoli propôs um pacto entre os poderes – aliás, um discurso que acalenta desde que assumiu o posto em meio a um dos maiores tiroteios internos e a um dos piores desgastes externos que a Suprema Corte já sofreu. O presidente do STF não soube explicar como o Supremo, a quem caberá dirimir dúvidas e divergências sobre propostas que vão estar no pacto, conseguirá acumular os papéis de árbitro e de parte. Mas os outros toparam – fazer o quê?

Ninguém, em sã consciência, se senta à frente do presidente da República para se recusar a fazer um pacto com ele em torno de reformas e medidas de combate ao crime. São aquelas generalidades com as quais quase todo mundo concorda de cara, e depois discorda na hora de aprovar de verdade. Estarão escritas no documento que os chefes dos poderes combinaram de assinar no dia 10 de junho para formalizar seu pacto – que, muito provavelmente, não vai fazer diferença alguma na ordem geral das coisas.

Antes mesmo do pacto, Rodrigo Maia, que é a favor da reforma da Previdência e, acima de tudo, representa no parlamento os setores que a defendem, decidiu tentar antecipar seu cronograma e pedir ao relator Samuel Moreira (PSDB-SP) que apresente seu parecer uma semana antes. Trata-se de uma tentativa e, sobretudo, de um discurso para a platéia do establishment, que anda muito nervosa.

Há sérias dúvidas de que Maia e o Planalto consigam os votos suficientes para aprovar a PEC ainda neste semestre, com pacto ou sem pacto. Seu companheiro do Senado, Davi Alcolumbre, tem pouco a perder ou ganhar com esse hipotético acordo. Fez o dever de casa direitinho ao barrar a mudança de endereço do Coaf na votação da medida provisória 870 na terça-feira. Ganhou espaço, inclusive, como articulador governista, já que o PSL, partido de Bolsonaro, bateu o pé quase até o último momento pela mudança – só evitada quando Bolsonaro e o ministro da Justiça, Sergio Moro, deram o dito pelo não dito por escrito, em carta, mudando de opinião sobre o destino do Coaf.

Dar o dito pelo não dito nunca foi tão freqüente no Sanatório Planalto. A ponto de, durante a votação da MP da reforma administrativa, o senador Angelo Coronel (PSD-BA) ter cunhado a expressão governo pingue-pongue, “porque de manhã é pingue, de tarde é pongue”. Assim como no domingo é pancadaria, e na segunda é agrado.

Nos próximos dias, é provável que o pacto entre os poderes vá avançar e refluir com a velocidade de uma mola, e ninguém tem ideia de como estará em 10 de junho. Nas circunstâncias atuais, porém, não passa de conversa de maluco.