Não há na história recente exemplo de pacto político de que tenha participado o Poder Judiciário. Por uma razão muito simples: é nele que desaguarão as demandas dos que se sentirem afetados pela reforma da Previdência, por exemplo. Onde a reforma trabalhista já está sendo disputada. E o Supremo pode, como tem acontecido frequentemente, assumir tarefas do Legislativo, o que provoca sempre mal-estar, mesmo quando o STF está certo.
O Executivo, dentro de um pacto político, pode abrir mão de legislar por medidas provisórias, apenas para dar um exemplo que dificilmente se concretizará, e o Legislativo pode se dispor a aprovar projetos vindos do Executivo. Mas o Judiciário, não.
O pacto entre os três Poderes anunciado ontem é uma boa idéia, até mesmo para acabar com a disputa entre eles, mas sua execução é difícil na plenitude anunciada. O Judiciário não pode fazer pactos sobre assuntos que vai julgar, como a reforma da Previdência, que é o principal ponto do acordo político que busca a “retomada do crescimento”.
Objetivo a ser alcançado por meio de negociações políticas. Várias cláusulas da reforma serão contestadas na justiça, e o STF terá que decidir. Ele não pode fazer parte de um acordo que define que a reforma da Previdência tem que ser aprovada. Nem mesmo o presidente Dias Toffoli, que estranhamente propôs um pacto político e não de Estado, pode garantir que o plenário do SFT vá concordar com ele.
Entre o Executivo e o Legislativo não há problema conceitual, embora existam problemas políticos a resolver, especialmente depois das manifestações de domingo. O presidente do STF não pode se comprometer a cumprir qualquer pacto que seja, porque tem de observar o princípio da independência judicial.
Nos exemplos de pactos políticos recentes, não está registrada a presença do Judiciário. O mais famoso dos pactos é o de Moncloa, na Espanha pós-franquismo, em 1977. O governo de centro direita de Adolfo Soares conseguiu o apoio pluripartidário para aprovar no Congresso programas de reconstrução econômica da Espanha, que se encontrava há cinco anos em recessão.
Perante o Parlamento alemão, em 2003, o chanceler social-democrata Gerhard Schröder propôs um plano de reformas nas relações de trabalhistas e no sistema previdenciário, no complemento do processo de incorporação da Alemanha Oriental.
A Democracia-Cristã, o principal partido oposicionista, aderiu ao projeto, e o governo teve o apoio do empresariado e de líderes da sociedade civil para implementar seu programa, que inicialmente teve a previsível oposição dos sindicatos.
Havia ainda os desafios da União Européia, que lançara o Euro como moeda única. As reformas destinavam-se, como as daqui deveriam, a alavancar a produtividade da economia. Por isso incluíam reduções salariais consideráveis e uma reformulação das regras do estado de bem-estar social.
Em ambos os casos, eram pactos de Estado, onde os pontos comuns partidários foram acomodados para a execução de um projeto de consenso. E nos dois casos deu certo. Aqui no Brasil tivemos também um Pacto pela Justiça, quando o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) era Nelson Jobim.
Nele, o presidente do Supremo podia propor medidas porque só se referia a assuntos de Justiça e do Judiciário. Buscava-se, fundamentalmente, aumentar a segurança jurídica e a maior agilidade do sistema judicial.
Estamos até hoje em busca de alguns objetivos lá propostos, como a redução dos recursos, e, no entanto, o ministro Dias Toffoli, que propõe hoje um pacto, defende o fim da possibilidade de prisão em segunda instância.
Este é um exemplo claro de que um acordo poderia ser feito, mas o Executivo, através do ministro Sérgio Moro, defende a medida, parte do Legislativo é contra e parte do Judiciário também.