O que existe, na verdade, é a velha contrafação de sempre ─ Lula deveria ser solto, segundo afirma o seu sistema de apoio, porque vai ser “bom para o país”. Só por causa disso? Sim, só por causa disso; não se julga necessário dar nenhuma outra razão. Não há surpresa alguma, aí. O Brasil já se acostumou, há anos, a ver os grandes cérebros da nossa política transformarem os interesses particulares do ex-presidente em necessidade nacional ─ se isso ou aquilo diz respeito a Lula, acham eles, então tem de dizer respeito a todos. Mas, no caso, Lula não está preso por ser uma “figura histórica”, ou porque pode levar o Brasil para cá ou para lá. Ele está preso porque é ladrão, segundo resolveu o único organismo que pode resolver se ele é ladrão ou não é ─ a Justiça brasileira.
Não é uma opinião. Quem diz que Lula é ladrão são os autos ─ as testemunhas, a exibição de fatos e as provas apresentadas. Mais que tudo, ele foi condenado num processo impecável do ponto de vista legal; seria difícil encontrar algum outro caso na história da Justiça penal brasileira em que as exigências da lei para punir alguém tenham sido obedecidas com tantos extremos de cuidado. Seu direito de defesa foi exercido na mais absoluta plenitude; não lhe foi negado rigorosamente nada, no incomparável arsenal de facilidades que a Justiça brasileira oferece a réus que têm milhões para gastar com advogados. Ninguém sabe ao certo o número de recursos, apelos, habeas corpus, mandados de segurança, agravos, embargos etc., que o réu socou em cima da Justiça para se defender. Passaram de 100, possivelmente, e tudo o que ele achou errado foi considerado certo pelas instâncias superiores. Fazer o que, então?
Ninguém reclama, ao mesmo tempo, que estejam presos Eduardo Cunha, Sérgio Cabral, Geddel Vieira Lima e tantos outros. Será que é porque roubaram mais? Ou porque sua prisão “não faz mal ao Brasil”? Jamais se menciona, também, que ex-presidentes presos não prejudicam a “imagem internacional” de país nenhum. Rafael Videla, da Argentina, morreu na cadeia. Park Geun hye, da Coréia, está cumprindo pena de 24 anos de prisão por corrupção. Alberto Fujimori, do Peru, aos 80 anos de idade, acaba de voltar ao xadrez para cumprir o restante da sua pena de 25 anos de prisão por ladroagem, após ter sido liberado por três meses para tratamento de um câncer. Por que teria de ser diferente com Lula?
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