Desde a tarde de domingo, Jair Bolsonaro deu uma entrevista, fez dois discursos e publicou 17 tuítes. O presidente fez autopropaganda, atacou a imprensa, criticou um instituto de pesquisas e debochou dos antecessores. Só não comentou a morte de Evaldo Rosa, metralhado pelo Exército quando levava a família para um chá de bebê.
O carro dirigido pelo músico tinha a bordo duas crianças, uma mulher e um idoso. Os soldados abriram fogo sem aviso. Acertaram ao menos 80 tiros de fuzil.
Depois de morto, Evaldo foi vítima de outro assassinato. Desta vez, de reputação. Em nota, o Comando Militar do Leste chamou ele e o sogro de “criminosos”. Os dois foram acusados de atirar contra os militares, que teriam respondido à “injusta agressão”. “Como resultado, um dos assaltantes foi a óbito no local”, concluiu o CML.
Apesar dos desmentidos de testemunhas e da Polícia Civil, o Exército sustentou a falsa versão até a manhã de segunda. Finalmente, admitiu “inconsistências” e informou que dez homens foram presos em flagrante. Eles serão julgados na Justiça Militar.
O falante Bolsonaro não se manifestou nem para consolar a viúva. O ministro Sergio Moro evitou dizer se o caso envolveria “escusável medo, surpresa ou violenta emoção”. O governador Wilson Witzel lavou as mãos. “Não me cabe fazer juízo de valor”, declarou.
O silêncio das autoridades soa como aval à escalada de mortes em ações policiais no país. Em 2017, foram 5.012, um salto de 19% em relação ao ano anterior. Fuzilado por engano, Evaldo se enquadrava no perfil mais comum das vítimas: 99% eram homens e 76% eram negros, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
A retórica do “tiro na cabecinha” e a falta de punição por excessos servem como licença para novas mortes. O crime de Guadalupe poderia marcar uma virada, mas os políticos não parecem empenhados em fazer sua parte.
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Depois de nomear mais um polemista de direita para o Ministério da Educação, Bolsonaro deveria atualizar seu slogan de campanha. Agora é “Ideologia acima de tudo, Olavo acima de todos”.