Não foi por acaso que o presidente Bolsonaro levou para o live que faz todas as quintas-feiras o ministro da Justiça e da Segurança Pública Sérgio Moro. Passados quase cem dias no governo, Bolsonaro está em queda de popularidade e Moro em alta, o que coloca o combate à corrupção e ao crime de colarinho branco como o projeto mais passível de apoio popular do que a Previdência, por exemplo, que é o centro das atenções do debate político e tem medidas claramente impopulares, mesmo que necessárias.
O ministro parece cada vez mais afinado com Bolsonaro nessa parte da política de segurança pública, que é o que faz a popularidade de Moro e ajudou Bolsonaro a se eleger. Segundo os especialistas, porém, a política tem menos a ver com a segurança pública e mais com combate ao crime, ponto que afeta diretamente o dia a dia do cidadão, mas que, se tratado como um fim em si mesmo, não trará resultados a longo prazo.
A visão de especialistas quase sempre colide com as decisões que estão sendo anunciadas, como a flexibilização do chamado “excludente de ilicitude”, uma das bandeiras do presidente Jair Bolsonaro, possibilitando redução ou mesmo isenção de pena de policiais que provocarem morte durante sua atividade.
O projeto permite que o policial que aja para prevenir agressão ou risco de agressão a reféns seja considerado como atuando em legítima defesa. Essa medida é considerada por Moro uma maneira de reforçar a segurança pública, e certamente tem o apoio da população.
Já técnicos em segurança pública consideram que o melhor seria trabalhar a redução da violência policial, priorizando a prevenção e a investigação. O controle de armas de fogo, restringindo sua disponibilidade, vai de encontro à decisão já anunciada de ampliar as possibilidades de porte de armas. Moro sugeriu duas armas por pessoa, e o presidente mandou ampliar esse número para quatro.
A redução do encarceramento não entra nos projeto do governo, embora o ministério da Justiça sob Moro tenha criado uma secretaria para tratar do sistema penitenciário, o que é um avanço. Mas, mais uma vez, a idéia não é reduzir, mas tornar mais eficiente o sistema penitenciário.
Um ponto de inflexão claro está na escolha do polêmico delegado federal Wilson Salles Damázio para suplente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciário, em lugar da cientista política Ilona Szabó, uma especialista em segurança pública que discorda das posições mais punitivas, desconvidada por decisão do próprio Bolsonaro.
Moro continua sendo uma referência de uma geração de juízes como mostra pesquisa recente da Associação de Magistrados do Brasil com abrangência nacional. Representa a média do pensamento de uma geração de juízes que prioriza o combate à corrupção, e entende que a legislação penal pode ser interpretada e flexibilizada para permitir um combate mais efetivo ao crime.
O presidente Bolsonaro continua se atrelando à Operação Lava Jato, o que leva o ministro Moro a dar-lhe credibilidade no combate ao crime. A impopularidade de Bolsonaro vem crescendo devido às trapalhadas de seu governo e a uma pauta de valores morais retrógrada, que não combina com as classes médias dos grandes centros urbanos, mas essa situação pode ser revertida com o combate ao crime.
Mas o combate à corrupção, que tem o apoio da população, pode ser afetado em setores importantes da população pelo reacionarismo do governo de Bolsonaro e por algumas medidas arbitrárias.
Como o fundo bilionário que o Ministério Público de Curitiba queria gerir, com base na multa que a Petrobras teve que pagar nos Estados Unidos devido à corrupção que afetou a performance de suas ações no exterior. O propósito seria financiar projetos educacionais e sociais que ajudassem a reduzir a criminalidade.
Moro também tem projeto para dar mais rapidez ao repasse dos recursos confiscados do crime, direcionando-os para projetos de prevenção de drogas, aperfeiçoamento das polícias e programas de reinserção social de dependentes, objetivos que são reivindicados pelos especialistas em segurança pública.
Ao contrário dos procuradores, no entanto, Moro enviou um projeto ao Congresso. Mas agora resolveu entrar no twitter, incentivado, disse, pelo presidente Bolsonaro. O que pode levá-lo a gostar mais de medidas populares do que das eficazes a longo prazo.
O Globo