Um dos deveres de um presidente da República é preservar a unidade do seu povo. Ao menos lutar por ela. A união, que não quer dizer pensamento homogêneo, é uma das forças de qualquer Nação.
Esse valor universal parece não sensibilizar Jair Bolsonaro, o escolhido das urnas de outubro último.
De tão empenhado em desconstruir tudo o que fora posto nas últimas décadas como verdades absolutas, o “mito” passa do ponto. Aliás, essa é sua especialidade.
Não falo em específico do direito de ter uma interpretação diferente sobre o 31 de março, dia em que o Congresso Nacional “cassou” sumariamente o mandato do presidente João Goulart.
Claro que é uma mentira reduzir o Regime Militar, ou a Ditadura, como queiram, apenas às aberrações autoritárias, e ao sangue derramado, o que já é muito. Há outros olhares possíveis sobre a gestão dos militares e o viés nacionalista e estruturante. Mas, o que ficou mais vivo na memória nacional, de fato, foi a barbárie, o excesso. Uma verdade: a Ditadura deixou muitas feridas abertas.
Refiro-me ao conjunto da obra. Os gestos e atos de Bolsonaro separam mais do que unem o Brasil, um país continental que se sustenta pela preservação dos laços de identidade, apesar das diferenças culturais, climáticas e econômicas.
É triste ver que, mesmo depois de uma conturbada eleição, há turbas se enfrentando nas esquinas. Uns sob o pretexto de defesa dos ideais de esquerda, ou do Lula Livre, outros querendo rescrever a história na marra. Ou no grito.
Bolsonaro já consumiu três dos quarenta e oito meses autorizados pelo brasileiro nas urnas. Ele e o seu entorno precisam entender que nem todos do universo de 55% dos seus eleitores saíram de casa para dar aval à sua cruzada ideológica. Muitos votaram nele para remover o PT, por uma esperança de vitória sobre a crise econômica, ou simplesmente para uma alternância de poder.
Da mesma forma, o PT tem que entender que não é o dono absoluto dos 45% dos votos alcançados por Fernando Haddad. Grande parte desse contingente apenas foi levado pelo antibolsonarismo e pelo receio do que a plataforma radical do capitão poderia representar. Manter o palanque armado e botar gasolina no fogo, apenas pelo revanchismo, é uma irresponsabilidade política.
Em algum momento, o Brasil espera ver Bolsonaro trocando a camisa de candidato pela faixa de presidente. O fim da campanha e o começo do governo, políticas públicas no lugar de palavras de ordem e uma oposição consistente, crítica e propositiva, no lugar de uma militância histérica e derrotada.