Como criança na Disney. Por Merval Pereira – Heron Cid
Bastidores

Como criança na Disney. Por Merval Pereira

20 de março de 2019 às 14h00 Por Heron Cid
O presidente da República, Jair Bolsonaro, discursa na Câmara de Comércio dos Estados Unidos, em Washington - 18/03/2019 (Mandel Ngan/AFP)

Diz-se de uma pessoa feliz em uma situação que está “como pinto no lixo”. Pois Bolsonaro parecia uma criança feliz na Disney. A visita aos Estados Unidos pode ser considerada um sucesso, com o apoio de Trump à entrada do Brasil na OCDE, o aceno para que nos associemos à OTAN,  a possibilidade de reduzir o déficit na balança comercial com os Estados Unidos, a utilização da Base de Alcântara pelos americanos, que pode trazer tecnologia e intercâmbio. Mas a política externa brasileira está sendo tocada por uma dupla assimétrica: o deputado Eduardo Bolsonaro indicou o chanceler Ernesto Araujo, mas faz questão de mostrar que quem manda é ele. Ontem, submeteu seu apadrinhado a uma humilhação pública, ao substituí-lo na audiência com o presidente Trump na Casa Branca.

Presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, o 03 na hierarquia familiar reforçou a idéia de que é o 01 da política externa. Muito parecido com os governos petistas, que tinham dois chanceleres: Celso Amorim, e a eminência parda do petismo, Marco Aurélio Garcia. Amorim conseguiu impor-se com o tempo e se transformou em um petista de cúpula. Mas Garcia tinha gabinete no Palácio do Planalto e uma influência indiscutível na formulação da política externa.

Como agora, não havia discordâncias ideológicas entre os dois, mas dificilmente o chanceler neófito Ernesto Araujo terá voz própria na política externa de Bolsonaro. As medidas radicalizadas que o governo abraça, como mudança da embaixada brasileira para Jerusalém; disputa com a China, que ainda vêem como comunista, uma atuação mais radical na Venezuela, todas saem da cabeça de Eduardo Bolsonaro, cujo papel nas relações internacionais foi elogiado por Trump: “Vejo o filho do presidente, que tem sido fantástico”.

Os dois, Eduardo e Araujo, são discípulos do ideólogo da radicalização de direita Olavo de Carvalho.      Os esquerdistas vêem golpes sempre que perdem, os direitistas têm mania de ver comunista em qualquer lugar. Por isso o presidente Bolsonaro disse nos Estados Unidos que “nosso Brasil caminhava para o socialismo, para o comunismo”.

No que foi seguido pelo presidente americano Donald Trump, que disse que pensa de forma semelhante a Jair Bolsonaro. “A última coisa que queremos nos EUA é socialismo”. Assim como o PT tem o socialismo só em seu programa, também o socialismo que Trump rejeita, na última eleição foi representado pelo veterano Bernie Sanders, que se diz liberal progressista.

Nos Estados Unidos, a social-democracia européia é sinal de comunismo. Não foi Bolsonaro quem impediu que o país se tornasse comunista, simplesmente porque nunca houve essa ameaça. Nem há, entre os bolivarianos que o PT financiou com o dinheiro da corrupção, um país comunista. Todos se dizem de esquerda, mas são mesmo cleptocracias ditatoriais.

Se o PT conseguisse permanecer no poder, tentaria implantar não o socialismo no Brasil, mas um governo autoritário, como a Venezuela de Chaves, ou a Nicarágua de Ortega. No máximo, o que chamam de socialismo do século XXI, que mascara com populismo a rapina dos tesouros nacionais.

Quem interrompeu a caminhada do PT não foi Bolsonaro, foi Dilma, cujo governo desastroso, e falcatruas no orçamento, deram espaço para seu impeachment. Quem governou o país nos últimos três anos foi Michel Temer, que de comunista ou socialista não tem nada.

Se eventualmente houvesse uma maquinação petista para assumir o poder sem contraposições institucionais, e tentaram várias vezes abrir atalhos para isso, o MDB velho de guerra é que inviabilizou a pretextada aventura abandonando a parceria com o PT e aderindo à oposição.

A aliança com os Estados Unidos, que é um ativo importante para o Brasil, foi tratada pelos Bolsonaros como uma benção dos céus. Até o ministro da Economia, Paulo Guedes, um dos pilares do governo, que foi muito claro no apoio à relação comercial com a China, caiu na esparrela e disse a certa altura que temos um presidente que adora os Estados Unidos, jeans, Disneylândia e Coca-Cola.

Para completar a sequência de embaraços, Bolsonaro, seguindo um twitter do filho 02, disse em uma entrevista na Fox que a maioria dos imigrantes não têm boas intenções quando vão para os Estados Unidos. Eduardo havia dito que os brasileiros ilegais nos Estados Unidos eram “uma vergonha” para o Brasil.

O presidente Jair Bolsonaro pediu desculpas mais tarde, alegando que cometera um equívoco, queria se referir à “menor parte”. O chanceler de facto passou batido.

O Globo

Comentários