O mal menor. Por Merval Pereira – Heron Cid
Bastidores

O mal menor. Por Merval Pereira

18 de março de 2019 às 17h00 Por Heron Cid
Presidente da República Fernando Collor de Mello no momento de sua renúncia, em dezembro de 1992. (Fotos: Wilson Pedrosa-29.dez.1992/AE e Divulgação)

O país vive há anos em busca do “salvador da pátria”, e só consegue encontrar o “mal menor”, o “erro novo”. Assim Jair Bolsonaro foi eleito em 2018, Collor em 1989. Apenas dois presidentes depois da redemocratização foram eleitos por projetos políticos: Fernando Henrique em 1994, com o Plano Real, e Lula em 2003, apresentando-se como alternativa ao que chamava de projeto neoliberal.

Os dois foram reeleitos em 1988 e 2006 esgotando as últimas reservas dos projetos vitoriosos. A reeleição, cada um a seu tempo, pareceu à maioria o “mal menor”. Fernando Henrique reeleito no primeiro turno, temendo ser derrotado se disputasse o segundo.

Lula ficou deprimido ao não conseguir vencer no primeiro turno, quando o então governador tucano Geraldo Alckmin teve uma votação espantosa de 41% dos votos. Depois, graças a erros banais e à campanha medíocre, teve menos votos que no primeiro turno.

Lula chegou ao poder em 2003 depois de perder quatro eleições, porque se reinventou criando o personagem Lulinha Paz e Amor. E lançou a Carta aos Brasileiros. Mas também porque o segundo governo de Fernando Henrique, que teve méritos evidentes como a Lei de Responsabilidade Fiscal, a Rede de Proteção Social, origem do Bolsa-Família, dos genéricos e do combate à Aids, ficou marcado pela desvalorização do Real logo nos primeiros dias, o apagão de energia e a economia em situação difícil.

Paradoxalmente, para acalmar o mercado financeiro, Lula teve que escrever a Carta aos Brasileiros onde se comprometia a manter o tripé da política econômica: câmbio flutuante, meta de inflação e equilíbrio fiscal. Foi isso que garantiu o bom desempenho econômico no primeiro governo Lula, e o tripé é a base da política econômica até hoje”

Em 2006 Lula, atingido em cheio pelas denúncias do mensalão, foi o “mal menor”. Sua reeleição pareceu à maioria a continuidade de um projeto político, solução menos traumática, apesar de tudo. Os demais presidentes foram escolhidos para derrotar alguém.

Com um crescimento de 7,5% no ano de 2010, Lula conseguiu eleger Dilma Roussef, mas deu início à crise econômica que resultou na recessão mais grave já havida no país.

A desastrada nova matriz econômica comandada pelo ministro da Fazenda Guido Mantega, e a absoluta incapacidade da presidente fizeram com que seu primeiro mandato presidencial terminasse em crise generalizada, inclusive com as primeiras denúncias de corrupção endêmica no petrolão, que dominou a campanha de reeleição.

Apesar de Dilma, Lula ainda tinha força suficiente para reelegê-la, mas à custa de uma campanha milionária financiada pelo dinheiro da corrupção. Dilma derrotou Aécio Neves, o candidato tucano, por uma diferença de 3% dos votos.

Mas, assim como em 1989, quando disputaram o primeiro turno Collor e Lula, não havia escolha boa, também em 2014, soube-se depois que Aécio Neves estava enredado na mesma teia de corrupção que denunciara durante a campanha.

Em 1989, qualquer resultado seria desastroso para o país, como foi a vitoria de Collor, que acabou impichado. Lula depois admitiu que seria uma tragédia se vencesse aquela eleição, pois não estava preparado para o cargo.

As crises econômica e moral levaram a um ambiente de rejeição ao governo Dilma, que acabou impichada, também porque o vice Michel Temer acabou aparecendo como “o mal menor”.

O governo substituto superou a inflação, e deu início ao fim da recessão, que durou três anos. Mas também se enredou em denúncias de corrupção que o paralisaram, impedindo que aprovasse a reforma da Previdência. Foi o governo mais impopular que o país já teve.

A rejeição à volta do PT acabou levando ao poder Jair Bolsonaro, que pareceu à maioria dos eleitores o “mal menor”, o “erro novo”. Só uma parcela deles, a mais barulhenta e atuante, o considera uma alternativa programática.

Com o país dividido, o centro político sumiu do embate eleitoral, e vivemos, após quase três meses de mandato, um ambiente político radicalizado incentivado pelo próprio presidente da República.

As crises se sucedem, com fatos novos diários a corroer a institucionalidade de Bolsonaro. A ponto de já se falar abertamente na possibilidade de o vice, General Hamilton Mourão, vir a assumir o governo caso a reforma da Previdência não seja aprovada e a economia continue em crise, com o país ladeira abaixo.

Mais uma vez, busca-se o “mal menor”. Até quando ?

O Globo

Comentários