O ministro Dias Toffoli iniciou os trabalhos da quinta-feira com um pronunciamento fora do script. Em tom grave, anunciou a abertura de inquérito sigiloso para apurar “denunciações caluniosas” contra o Supremo Tribunal Federal. Alegou a existência de ameaças “à honorabilidade e à segurança” da Corte.
Na sequência, o ministro Gilmar Mendes disparou seu ataque mais radical à Lava-Jato. Chamou os investigadores de “desqualificados”, “cretinos”, “covardes”, “despreparados” e “gentalha”. “Assim se instalam as milícias. O esquadrão da morte é fruto disso”, sentenciou.
Ao fim da sessão, soube-se que o inquérito de Toffoli investigará procuradores de Curitiba e auditores da Receita. O presidente do Supremo dispensou o sorteio eletrônico e delegou o caso ao ministro Alexandre de Moraes. Em outro lance incomum, a Procuradoria-Geral da República não foi consultada ou convidada a participar das apurações.
A ofensiva é o movimento mais ousado da dobradinha Toffoli-Gilmar. Os dois ensaiavam uma ação conjunta desde fevereiro, quando se descobriram na mira do Fisco. Um relatório ligou Gilmar, sua mulher e a mulher de Toffoli a suspeitas de irregularidades financeiras.
Até aqui, a dupla conseguiu ganhar no grito. O ministro da Economia, Paulo Guedes, aceitou a pressão e transformou investigadores em investigados. O secretário da Receita, Marcos Cintra, prometeu “ações punitivas”. Chegou a chamar subordinados de“meliantes”.
O entrosamento entre Toffoli e Gilmar ficou conhecido nas sessões da Segunda Turma. No entanto, a sintonia não se limita aos julgamentos de políticos acusados de corrupção. Em ao menos dois episódios, o ministro mais antigo saiu em socorro do mais novo.
Em 2015, Gilmar livrou José Ticiano Dias Toffoli, ex-prefeito de Marília e irmão de quem o nome indica, de uma ação de inelegibilidade. No ano seguinte, ofereceu um escudo quando o colega foi citado na delação da OAS. Disse que era preciso “colocar freios” nos procuradores, a quem acusou de embarcar em “delírios totalitários”. “Calcem as sandálias da humildade”, prosseguiu. Se o ministro já tiver encontrado um par do seu número, ninguém ficou sabendo.
Há seis meses, a dobradinha ganhou poder inédito com a chegada de Toffoli à presidência do Supremo. Ele já retribuiu o apoio do colega ao comandar a reação contra a Receita. O maior risco para a dupla é exagerar na dose. Em vez de parar os ataques, a nova ofensiva atiçou a militância bolsonarista. Sua nova cruzada é para convencer o Senado a abrir um processo de impeachment contra Gilmar.
O Globo