Ao assistir à pantomima representada no Senado Federal nos dias 1º e 2 de fevereiro, tive dois sentimentos.
Primeiro, eu me diverti. Viajei na saudade do meu tempo de membro irresponsável do Centro Acadêmico Visconde de Cairu (1948-51), na FEA/USP.
Nele as eleições eram teatralizadas com a mesma deselegância: duas tribos irredutíveis, certas de que eram as únicas e verdadeiras portadoras da história, usavam o baixo calão como alta dialética, para escracharem-se mutuamente. Na hora da eleição, alguém desligava a energia e roubava a urna.
O outro sentimento que sobrou foi o de pânico. A despeito da minha grande esperança na democracia representativa, tenho sérias dúvidas que “representantes” controlados pelas mídias sociais possam dar conta de aprovar a reforma da Previdência.
No curto prazo, ela tem poderosos “perdedores” e nenhum “ganhador”, a não ser a abstrata sociedade que não tuíta! Os senadores precisam de energia externa para pensar, o que nos aproxima da democracia direta e suas graves ameaças.
O desenvolvimento social e econômico é um estado de espírito que se instala na sociedade quando ela reconhece uma liderança sólida, apoiada numa burocracia profissional eficiente, ambas controladas por uma Constituição que dá segurança e previsibilidade às relações entre os seus membros.
Isso exige instituições que reduzam o custo de transação e libertem a iniciativa e a imaginação criadora de todos os cidadãos.
O líder obedece à ética da responsabilidade. Deve convencer seus seguidores a enfrentarem a dura realidade da inevitável escassez de recursos diante de demandas infinitas. Deve domesticar a sua demagogia, esconder sua vaidade e ter presentes as consequências de suas ações.
Há alguma relação entre esse ser quase divino e o senador tuiteiro que espera a instrução de fora?
Lembremos que, há 2.400 anos, o que incomodava Platão era que a “democracia direta” depende da instável e volúvel vontade da “maioria” dominada por instintos irracionais despertados por demagogos.
O protagonismo dos senadores tuiteiros e a sua absoluta falta de cerimônia com relação à sacralidade do Senado (o “conselho dos homens velhos” inventado na velha Roma) são perturbadores, pois são eles que detêm o poder de confirmar as indicações do Executivo para a constituição do Judiciário e para a Procuradoria-Geral da República, de controlar a Federação e de aprovar as reformas —impopulares, mas necessárias (art. 52 da Constituição Federal).
A solução talvez seja envolver o Senado numa gaiola de Faraday, que interromperá a comunicação dos celulares para testar se nele há vida inteligente.