Tanto quanto o impacto e a surpresa pela precocidade e forma, a morte da sobriedade é a consequência imediata do acidente que vitimou o jornalista Ricardo Boechat.
Na atmosfera conturbada que vivemos no Brasil, o radicalismo é o mandamento. Da imprensa, parte de um irado público exige o mesmo nível de engajamento cego e fundamentalista.
E nem todos os profissionais, por mais experientes e inteligentes que sejam, se vacinam do contágio desse vírus.
Boechat era uma dessas felizes e raras exceções.
Tinha posição sobre tudo, mas sem perder a necessária capacidade da ponderação, da visão ampla e da coragem de desagradar muitas vezes os dois lados da polarização burra, rasa e previsível.
Era equilibrado por natureza e formação, blindado de paixões políticas, imune à sedução de um ativismo militante que tantas vezes contamina e empobrece o jornalismo.
Essa característica tão forte lhe emprestou toda a aura de credibilidade e independência que se espera dos verdadeiros jornalistas, comprometidos em comentar fatos, não analisar pessoas.
A voz da sobriedade, do equilíbrio e da intrepidez crítica também foi esmagada entre as ferragens daquele helicóptero.
Em tempos de profunda e lamentável histeria, a morte da lucidez aumenta o luto de quem admira, reverencia e necessita de tolerância e bom senso.
No rádio, na TV, na Internet, na vida…