A impressionante deterioração do prestígio do presidente Jair Bolsonaro, a menos de um mês de ter sido empossado , está provocando um rebuliço no Congresso, onde lideranças que negociam a eleição dos presidentes da Câmara e do Senado recuam e avançam, na tentativa de entender para que lado o vento do poder está soprando.
Já houve momento em que ser o candidato do governo valia ponto, e o senador Renan Calheiros se apressou a anunciar que “o novo Renan” queria negociar com o governo Bolsonaro. Também Rodrigo Maia, tentando a reeleição, foi visto ao lado do presidente, todo sorridente, depois de ter sua recandidatura não rejeitada pela cúpula do novo governo.
Em poucos dias, porém, o vento mudou de rumo. Os escândalos envolvendo o filho do presidente, o senador eleito Flávio Bolsonaro, estão indicando que talvez Bolsonaro não chegue ao dia 1º de fevereiro, dia da eleição, com essa bola toda.
É hora de demonstrar independência, de vender a idéia de que, nesta hora, o Congresso pode tomar as rédeas da política e tem, pela primeira vez, desde o governo Fernando Henrique a bordo do Plano Real, a chance de ser o protagonista da História, conduzindo o governo em vez de ser conduzido por ele.
A partir do Plano Real, o Congresso, na análise de lideranças partidárias que buscam equilibrar-se na corda bamba em que se transformou o momento político, o Executivo, que sempre teve muitos poderes, emparedou o Congresso devido à popularidade de seus eleitos.
Antes, Collor conseguiu passar até mesmo o bloqueio generalizado das contas bancárias e investimentos, Lula até conseguiu eleger Dilma. Nos dois casos, os presidentes que tinham, por razões diversas, chegado ao poder com prestígio que fazia o Congresso se dobrar à sua vontade, acabaram impedidos em processos político-administrativos por terem se isolado nas relações com o Congresso.
Collor considerava-se acima dos partidos, pois chegara ao poder sem necessidade deles. E Dilma tinha em Lula sua garantia política, e por isso não dava bola para o Congresso, que se vingou dos dois, quando perderam a popularidade.
Collor mais rapidamente, cerca de três anos depois de ser eleito. Dilma depois do primeiro mandato, num processo que teve início em dezembro de 2015 e se encerrou em agosto do ano seguinte.
A eleição de Jair Bolsonaro, provocando uma verdadeira revolução política no país, fazia prever que sua popularidade, juntamente com o uso eficiente das redes sociais, legalmente ou ilegalmente, o tornaria um daqueles líderes a que o Congresso tem que se curvar.
Alguns membros do governo expressaram essa certeza, como o todo-poderoso ministro da Economia Paulo Guedes, que chegou a dizer que era preciso “dar uma prensa” no Congresso. O governo que não negociou com os partidos a formação do ministério tem sinais de que confia na capacidade de pressão da opinião pública para fazer aprovar reformas, mesmo as impopulares, como a da Previdência.
Essa situação não estava fora da realidade, até que o filho 01 levou para dentro do Palácio do Planalto escândalos que insinuam uso de dinheiro público ilegalmente, lavagem de dinheiro, corrupção e, o mais grave, ligações perigosas da família Bolsonaro com milicianos.
Não é apenas a proximidade de idéias e comportamento, mas há dinheiro envolvido nessa relação. O presidente, eleito principalmente para combater a corrupção, que demonizava a velha política e se propunha a renovar os métodos de negociação parlamentar, de repente vê-se em meio a uma rede de intrigas e ilegalidades que só faz corroer sua credibilidade junto à parte do eleitorado que acreditou que ele seria o salvador da pátria.
Esse desgaste está apenas começando, e as lideranças políticas no Congresso já começam a se convencer de que o enfraquecimento precoce do presidente favorece uma reação política. É de se prever que a agenda do ministro Sérgio Moro de combate à corrupção na política sofrerá abalos, tendo dificuldades para aprová-la.
A reforma da Previdência, uma necessidade, pode ser aprovada, mas os congressistas estão dispostos a fazer bondades para amenizar a impopularidade que ela trará.
Os políticos que sobreviveram ao tsunami Bolsonaro disseminam a tese de que quem enfraqueceu a classe parlamentar foi a Operação Lava-Jato, que demonizou a atividade política, e não seus próprios atos. E estão dispostos a dar o troco.
O Globo