É quase certo que o Supremo Tribunal Federal (STF) seja acionado para impedir a reforma da Previdência, com argumentos já utilizados para questionar reformas anteriores: afronta a direitos adquiridos, configuração de confisco, violação de ato jurídico perfeito e desconsideração de expectativas legítimas dos contribuintes dos sistemas.
Segundo o constitucionalista Gustavo Binemboin, a jurisprudência do Supremo tem sido de que apenas os aposentados, ou os que já tenham preenchido os requisitos para a aposentadoria, têm direito adquirido.
A ampliação de tempo de contribuição, e a imposição de idade mínima, podem, portanto, alcançar todos os que ainda não tenham preenchido os requisitos do regime atualmente em vigor. A majoração de alíquotas de contribuições tende a ser admitida, pois o Supremo já decidiu que ninguém tem direito adquirido a não ser tributado no futuro, inclusive os inativos.
Quanto às privatizações, Binemboin lembra que a jurisprudência do STF se limita a controlar aspectos formais da venda do controle acionário de empresas estatais. A Reforma Tributária também deve ser feita por emenda constitucional, e o desafio será superar alegação de afronta ao pacto federativo, e as garantias dos contribuintes, que o Supremo já entendeu serem também cláusulas pétreas.
O governo, segundo o constitucionalista, deverá ter êxito se o Supremo adotar uma concepção minimalista em relação às cláusulas pétreas, como, por exemplo, admitindo um novo arranjo tributário para a Federação – se for criado um IVA que junte o IPI, o ICMS e outras contribuições –, desde que a reforma não esvazie a autonomia de estados, municípios e Distrito Federal.
No que se refere às garantias dos contribuintes, Gustavo Binemboin lembra que apenas uma vez a Corte pronunciou a inconstitucionalidade de uma emenda constitucional, na criação do IPMF, que não respeitava o princípio da anterioridade tributária. Na Reforma Orçamentária, parece ser intenção do novo governo conceder maior liberdade ao Congresso Nacional na elaboração do orçamento anual.
A proposta do então candidato Bolsonaro falava em “orçamento de base zero”, que seria a possibilidade de total liberdade de alocação de receitas na lei orçamentária, a cada ano. Não há, segundo Gustavo Binemboin, em nenhum país civilizado, nem mesmo nos de desenvolvimento semelhante ao do Brasil, esse tipo de amarras na Constituição.
Como a maioria dessas normas é proveniente de emendas constitucionais, não haverá problemas, avalia Binemboin, em se aprovar uma PEC para desamarrar o orçamento e permitir que o governo e o Congresso legislem mais democraticamente sobre como as receitas públicas devam ser alocadas, sempre observando o teto geral de gastos, também previsto na Constituição.
A maior mobilidade na alocação dos recursos é condição prioritária para que esse objetivo seja alcançado. Caso o Supremo seja provocado, a tendência é no sentido da aprovação da medida.
Em matéria de direitos e garantias individuais, os desafios devem surgir quanto à alteração da maioridade penal, por exemplo. Segundo Gustavo Binemboin, não parece ofender nenhuma cláusula pétrea a alteração da idade de 18 para 17 anos, que não chega a configurar uma medida “tendente a abolir” direito ou garantia individual.
O mais correto, na opinião do constitucionalista, seria, como sugeriu o futuro ministro Sérgio Moro, que a redução da maioridade penal alcance apenas crimes graves, como homicídio e latrocínio, por exemplo, em que a consciência da ilicitude pode facilmente ser presumida em jovens de 16 ou 17 anos.
O Globo