Fellini poderia filmar as cenas noturnas de Casanova em Veneza numa grande piscina em Cinecittá, mas preferiu um estúdio para criar com plástico e celofane azul e verde, luzes e vento, uma perfeita ilusão de água em movimento, onde filmava a gôndola de Casanova navegando e enganava todo mundo. Alem da ficção, era um fake que ganhava um valor artístico.
Rei do fake, o gênio Orson Welles começou com uma transmissão ao vivo pelo rádio de uma invasão da Terra por marcianos tão realista que levou panico à população. Para a ficção funcionar, foi fundamental a veracidade da transmissão fake. Anos depois, Welles fez um grande filme sobre o falso e o verdadeiro com “F for Fake”, que no Brasil se chamou “Verdades e mentiras”.
É um documentário sobre o genial falsário de quadros Elmyr de Hory e seu biógrafo, Clifford Irving, célebre por uma biografia falsa do magnata Howard Hughes, em que Welles faz uma reflexão sobre os valores verdadeiramente falsos e os falsamente verdadeiros. Algumas falsificações podem ser melhores do que os originais? No início do filme, o próprio Welles aparece fazendo alguns truques de mágica para crianças e anunciando metaforicamente o seu tema: a arte do ilusionismo.
Em seu belíssimo “O fundo do coração”, Francis Ford Coppola recriou Las Vegas em um estúdio gigantesco para ambientar um musical romântico em que o falso e o verdadeiro se misturavam em harmonia. Mas o público não entendeu nada, e o filme fracassou.
Mas o fino do fake é a síntese elegante de Fernando Pessoa quando diz “o poeta é um fingidor, finge tão completamente, que chega a fingir que é dor, a dor que deveras sente”.
O Globo