Este jornalista começa fazendo uma declaração: não repatriou dinheiro depositado irregularmente no exterior, não declarou bens adquiridos além-fronteira e que eram desconhecidos da Receita Federal — até porque não tem nem uma coisa nem outra — nem é amigo pessoal de quem o tenha feito — não que saiba ao menos. Logo, o que se vai debater aqui é uma situação em tese, que diz respeito à segurança jurídica e à relação que o Estado brasileiro pretende manter com seus cidadãos.
Qual é o busílis? Sérgio Moro, futuro ministro da Justiça e candidato a justiceiro de aflições reais e imaginárias dos brasileiros, está de olho nos R$ 174,5 bilhões em bens e dinheiro que brasileiros admitiram ter no exterior — parte considerável desse montante repatriada. Quer usar a lista de quem admitiu os recursos — e pagou uma pesada multa por isso — para fazer uma investigação especial.
Para lembrar: no fim de 2015, o Congresso Nacional aprovou a lei que criou o Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária. Pessoas físicas e empresas que tivessem recursos ou bens no exterior não declarados à Receita Federal poderiam regularizar a situação mediante o pagamento de 15% de Imposto de Renda e 15% de multa. Houve duas etapas do programa.
Na primeira, o regime de repatriação valia para os residentes ou domiciliados no país em 31 de dezembro de 2014 que tinham ativos, bens ou direitos em períodos anteriores a essa data no exterior não declarados à Receita. Aderiram ao programa 25.011 pessoas físicas e 103 empresas.
A maior parte dos ativos (R$ 163,87 bilhões) foi declarada pelas pessoas físicas. As empresas, por sua vez, responderam por R$ 6,06 bilhões. No ano passado, houve uma segunda fase, totalizando, então, R$ 174,5 bilhões, o que rendeu aos cofres públicos R$ 52,6 bilhões: com 27 mil contribuintes e 123 empresas.
Antes que você pense que essa é uma mamata típica do Brasil, saiba que 38 dos 47 países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) adotaram programas semelhantes. A lei aprovada, note-se, fala em recursos obtidos licitamente. Quem aderiu ao programa pagou os 30% entre imposto e multa e se livrou das imputações de evasão de divisas e sonegação fiscal. Por óbvio, indício de algum outro crime envolvendo esses bens merecerão, se vieram à luz, a devida sanção legal. É claro que o Brasil fez bem em adotar esse programa. Até porque os que resolveram admitir os bens não foram anistiados. A parcela recolhida ao Tesouro foi alta. Mas…
Mas Sérgio Moro está de olho nessa grana. Informa o Globo:
“A gestão do futuro ministro da Justiça, Sergio Moro, quer investigar a origem dos R$ 174,5 bilhões que pertencem a brasileiros, estavam no exterior sem registro na Receita Federal e foram regularizados graças a dois programas de incentivo editados nos governos de Dilma Rousseff e Michel Temer. (…) O plano de Moro é incrementar a integração entre a Polícia Federal, o Ministério Público Federal e unidades de inteligência financeira, em especial o Conselho de Atividades Financeiras (Coaf), para verificar o uso dos valores por organizações criminosas — tanto aquelas com atuação violenta, como tráfico de drogas e armas, quanto as envolvidas em crimes de colarinho branco. Essas condutas não estão anistiadas pela lei.”
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