A sete semanas da posse, Jair Bolsonaro contratou a primeira crise do novo governo. A saída de Cuba do Mais Médicos pode deixar 24 milhões de brasileiros sem assistência básica de saúde. Ninguém poderá dizer que ele não se empenhou por este desfecho.
Na campanha, o presidente eleito fez ofensas e ameaças aos médicos vindos da ilha. Hoje eles somam 8.332. A maioria atua em periferias ou grotões onde os doutores brasileiros não querem trabalhar.
“Vamos expulsar com o Revalida os cubanos do Brasil”, discursou o então candidato em agosto, do alto de um trio elétrico em Presidente Prudente.
Em outra fala, divulgada nas redes sociais, ele inflou os números do programa e prometeu “dar uma canetada mandando 14 mil médicos lá para Cuba”. Acrescentou que os profissionais poderiam se alojar em Guantánamo, onde os EUA mantêm uma prisão militar.
Os médicos cubanos não escolheram o regime que governa sua terra natal, mas se tornaram alvo da cruzada de Bolsonaro contra os “vermelhos”. Na campanha, o discurso pode ter rendido votos. No governo, ameaça gerar um apagão na saúde dos mais pobres.
Em cinco anos, mais de 20 mil cubanos passaram pelo Mais Médicos. Em um terço dos municípios atendidos, foram os únicos a aceitar as vagas oferecidas pelo programa. Hoje são ampla maioria em aldeias indígenas e comunidades ribeirinhas.
Além do Brasil, outros 66 países mantêm contratos de cooperação médica com a ilha. O dado mostra que a importação de doutores não é invenção do PT, como costuma sugerir o presidente eleito.
O adeus dos cubanos era questão de tempo, mas Bolsonaro reagiu com irritação ao anúncio de Havana. Na quarta-feira, ele comparou os profissionais a “escravos” e chegou a dizer que não haveria comprovação “de que eles sejam realmente médicos”. Conversa de palanque, porque o programa exige diploma superior e conhecimento dos protocolos do SUS.
O discurso agressivo esconde o verdadeiro problema: o novo governo parece não ter ideia de como substituir os cubanos que deixarão o país. Até aqui, só conseguiu organizar o lançamento do Menos Médicos.
No aniversário de 129 anos da República, o “príncipe” Luiz Philippe de Orleans e Bragança, eleito deputado pelo PSL, disse que o Brasil não tinha “nada a comemorar”. O novo regime está cheio de entusiastas da ditadura militar, mas também há quem sonhe com uma volta aos tempos do Império.