Governos estrangeiros já começaram a traçar seus cenários alternativos para um eventual governo Bolsonaro e a avaliar o risco à democracia brasileira.
Uma das analogias mais comuns é com a Turquia, país onde um governo eleito subverteu as regras do jogo para restaurar o autoritarismo. O segundo cenário são as Filipinas, onde o governo usa milícias anticrime para, na realidade, dar batalha a opositores e, no processo, abrir as portas para um possível experimento autoritário.
A terceira analogia é com Donald Trump, líder populista que surfa na onda da raiva popular contra o establishment e, dessa forma, produz polarização destrutiva. Neste último caso, a democracia é erodida, mas não quebra.
É impossível saber se Bolsonaro vai seguir um desses três modelos. Mas é um equívoco grosseiro acreditar que sua personalidade será o principal fator a determinar o futuro da democracia brasileira. Afinal, seu governo será função de processos complexos que vão muito além de sua vontade, inclinação ou apreço pela democracia.
Para entender a trajetória futura de nosso sistema político, o mais importante é olhar para dois sinalizadores fundamentais: o método que Bolsonaro utilizará para formar uma maioria governista e o tratamento que dará às corporações que operam em Brasília.
Bolsonaro virou líder popular de uma revolta contra o sistema político existente. Nesse sistema, o presidente da República monta maiorias por meio de uma troca: o Parlamento apoia a agenda presidencial porque recebe oportunidades de ganhos materiais (legais e ilegais).
Agora, Bolsonaro tem uma escolha a fazer. Ou ele reedita esse sistema com alguns retoques superficiais, ou ele apela diretamente ao eleitorado. Na segunda opção, o presidente joga a opinião pública contra o Parlamento em “lives” no Facebook. Ambas as opções são péssimas para a qualidade da democracia brasileira.
O segundo sinalizador importante diz respeito ao compromisso de Bolsonaro com as contas públicas. Se ele fizer uma sinalização custosa já nos meses de transição —por exemplo, dizendo aos militares que a reforma da Previdência terá de chegar a eles também—, então o barco da economia brasileira irá por um caminho.
Se, ao contrário, Bolsonaro sinalizar que seu governo será um condomínio de corporações, onde todos terão algum tipo de “boquinha” no Estado —com exceção daqueles grupos vinculados ao PT, como sindicatos e as ONGs de direitos humanos que ele promete punir—, então o barco irá por um caminho muito distinto.
A decisão determinará o futuro da política brasileira. Dentre as analogias disponíveis, o melhor cenário para a democracia brasileira é Trump.
Folha