Em 15 dias o país terá um novo Presidente, mas os debates durante a campanha, mesmo com o segundo turno, até agora não foram suficientes para que a sociedade pudesse avaliar a viabilidade de boa parte das propostas para a educação dos dois candidatos que restam na disputa. De certo são projetos muito distintos. Uma leitura dos programas de governo deixa claro, por exemplo, que as duas candidaturas fazem diagnósticos bastante diferentes do quanto deve ser investido no setor. O PT fala em ampliar os gastos, visando chegar a 10% do PIB, enquanto para a candidatura de Bolsonaro o entendimento é de que o principal problema é de eficiência, pois o país já investe, em proporção do PIB, um valor equivalente ao de nações desenvolvidas.
Seria bom ouvir de Haddad mais sobre como será possível ampliar o gasto num cenário de forte restrição fiscal, e sem produzir mais ineficiência. E, de Bolsonaro, qual seria a mágica para dar um salto de qualidade no ensino investindo, por aluno (o que é diferente do percentual do PIB), metade do verificado nas nações mais ricas na educação básica.
Um dos poucos pontos em comum nas duas propostas é a sinalização de que querem alterar a recém-aprovada Base Nacional Comum Curricular. Provavelmente, as mudanças que cada governo faria no documento seriam bem distintas, mas até agora nenhuma das candidaturas detalhou o que e como seriam feitos esses ajustes.
Até por ser mais detalhado e por Haddad já ter sido ministro da Educação, é mais fácil prever como seria sua gestão. Simplificando bastante, pode-se dizer que seria um pouco mais do mesmo, argumento que será visto como positivo para seus simpatizantes e como negativo para seus críticos.
No caso de Bolsonaro, líder nas pesquisas, há muito menos clareza, pois seu programa é bem menos detalhado e sua campanha tem se negado, desde o primeiro turno, a enviar um representante para os debates convocados por meios de comunicação ou organizações do terceiro setor sobre o tema.
Em sua última declaração sobre o assunto, o deputado disse que procurava um ministro com autoridade para “expulsar a filosofia de Paulo Freire”. Seria um sinal de respeito com os eleitores (tanto os que simpatizam com essas ideias quanto com os que discordam) se ele ou alguém de sua campanha explicasse como faria isso. Mudando os currículos de cursos de formação de professores? Desde a redemocratização governos tentam, sem sucesso, ter mais influência nessa formação, mas todos esbarram, entre outros obstáculos, na autonomia didática das universidades, garantida pela Constituição. Numa democracia, não há nada de errado em discordar e até criticar a influência de Freire, mas é pouco provável – sem falar no obscurantismo da proposta – que um governo conseguisse “expulsar” o educador brasileiro mais conhecido no mundo dos currículos nacionais em Pedagogia e Licenciaturas.
Com exceção de países pequenos ou ditatoriais, é muito difícil para qualquer governo, de esquerda ou de direita, promover reformas radicais no ensino. Não é à toa que é internacionalmente famosa a alegoria do sujeito que ficou congelado por séculos e que, ao voltar, não consegue reconhecer no mundo de hoje nada além da sala de aula com a qual estava acostumado no passado. O Brasil tem 5.570 redes municipais, 27 estaduais, e aproximadamente 2,4 milhões de professores na educação básica. Sem que esses atores estejam convencidos das mudanças, qualquer reforma, para o bem ou para o mal, ficará capenga ou nem sairá do papel.
O Globo