Quando pegou no telefone, direto de São Paulo para falar com os paraibanos na Rede Arapuan de Rádio, hoje, a candidata Marina Silva (Rede) estava inspirada.
Em vinte três minutos de entrevista, a ex-seringueira botou a audiência do Arapuan Verdade para, no mínimo, fazer uma profunda reflexão.
Em reta final da campanha na disputa com Ciro Gomes pelo segundo lugar nas pesquisas, ela não perdeu a fé, mesmo sendo candidata praticamente isolada com sua Rede, pela terceira vez.
Qual a sua expectativa?
“Minha expectativa é que a sociedade olhe para as propostas dos candidatos. Que os brasileiros não percam uma oportunidade de fazer uma mudança. O Brasil não pode se acostumar com essa lógica do rouba, mas faz. É possível fazer sem roubar. O Brasil está no fundo do poço. A saída do Brasil vai depender da consciência dos brasileiros”.
Instigada pelo ávido jornalista Gutemberg Cardoso pelo perfil tido e havido como frágil, Marina deu uma resposta instigante.
O que a senhora acha dessas avaliações?
“Eu não faço campanha como os marqueteiros mandam. Aliás, o Brasil está pagando um preço alto. Dilma fazia tudo que o João Santana mandava. E a sociedade brasileira vinte dias depois das eleições se deparou com um Brasil de água a baixo. O marqueteiro do PT e de Dilma ganhou R$ 70 milhões de dinheiro roubado da Petrobrás, dinheiro que era pra ser usado para a saúde. Que era para ser usado para as pessoas quando vão ao hospital. Ele ficava dizendo o que ela tinha de dizer para enganar a população. Ser presidente não é pra ter força física, é pra ter força moral. Vou fazer Bolsa Família sem roubar. Vou fazer as cotas sem roubar. Aquilo que é feito com o dinheiro do Estado não é de nenhum partido. Temos que parar de achar que o presidente que faz alguma coisa com o dinheiro público você deve a ele pelo resto da vida. Voto não é por gratidão, é por convicção”.
O autor do Blog imprensou e lembrou que parte do eleitorado chama a ex-senadora de “candidata Copa do Mundo”, que só se vê de quatro em quatro anos.
Onde estava Marina na crise?
“Você nunca me viu mesmo foi em nenhuma denúncia de corrupção. Depois da eleição, eu voltei a trabalhar, trabalhei pela cassação da chapa Dilma-Temer, apoiando a Lava Jato, combatendo o foro privilegiado. Eu tenho me posicionado o tempo todo, mas como eu não tenho canal de televisão ou rádio eu não tenho como aparecer todo dia. Tem uma coisa que eu estou sumida mesmo: da Lava Jato”, tascou.
Evangélica, mas acusada de pisar em terreno movediço quando enfrenta temas polêmicos, ela não se abateu.
A senhora não precisa de mais firmeza nesses temas da Igreja?
“Eu tenho posições firmes, sou contra o aborto e a legalização das drogas. No Brasil, não se deve deixar que o Congresso mude uma lei tão grave quanto essa, porque pode ter certeza que eles vão passar por cima do povo brasileiro. Se for pra fazer isso, que seja pelo plebiscito em vez de ser decidido por 500 deputados e 81 senadores. O presidente não convoca plebiscito. A única coisa que digo que é que se querem ampliar o aborto no Brasil eu defendo que seja por plebiscito.
Minha fé e a fé do Bolsonaro quem julga é Deus. Eu aprendi com Jesus a não julgar ninguém. Ele diz também que se conhece a árvore pelos frutos. Eu procuro dar frutos de paz. Eu tenho 32 anos de vida pública, não tenho nenhum envolvimento em corrupção.
Coerente com o que está no livro de Provérbios 31: Abre a tua boca em favor dos necessitados. Não posso acreditar que alguém que seja presidente possa dizer que vai governar só para os fortes. Eu aprendi que na posição de Governo se deve olhar sobretudo para os fracos. Foi isso que Salomão fez na luta sobre de quem era o filho de duas mulheres. Duas mulheres. Mulher não tinha valor, ainda mais sendo prostituta. Salomão julgou fazendo justiça aos fracos. Eu tento traduzir isso não no discurso. Porque sei que a coisa mais importante é o amor. Como diz o apóstolo Paulo. É o amor que consegue tirar todo medo. O amor não é odioso. O amor tudo suporta”.
A senhora tem inspiração de esquerda, parte da esquerda prega que eleição sem Lula é fraude e grita Lula Livre. Por que a senhora não está nessa tese?
“Eu não fico nessa polarização esquerda e direita. Estou à frente. Há muito tempo que estou tentando construir uma outra alternativa, que é uma visão progressista e sustentabilista. As pessoas se esqueceram de ser fraternas. Hoje o que está sendo cultivado é o ódio. Eu fico vendo Bolsonaro estimulando crianças ao gesto de dar um tiro, ele não foi protegido pelas armas, ele estava com contingente de policiais e guardas e infelizmente uma pessoa com uma faca na mão quase tirou sua vida. Eu agradeço a Deus porque aquela pessoa que não tinha uma arma de fogo na mão, como defende Bolsonaro.
Não digo que todos se corromperam. O meu caminho é o da porta estreita. A porta larga é o que leva o caminho da perdição. Eu estou concorrendo como Davi contra Golias. Sem tempo de televisão e um pouquinho só de fundo partidário e eles têm bilhões. Minha campanha vai ser uma espécie de esmola da viúva pobre. Tudo que tenho é a minha integridade. Tudo o que eu tenho são as minhas propostas”.
Ao final, uma comovente exortação às mulheres.
“Eu quero pedir a ajuda das mulheres. Mulher, quando a gente tenta fazer alguma coisa, eles tentam nos desqualificar, dizer que a gente não tem força, que a gente não pode. Você tenta fazer um curso numa faculdade, dizem que você não pode. Eu enfrentei isso em toda minha vida e continuo enfrentando. Me ajude. Não permita que continuem tentando fazer a gente de gato e sapato. Nós podemos e eu quero ser presidente para que nunca mais tenham que dizer que nós não podemos e não sabemos. Nós podemos e sabemos e, com a ajuda de Deus e do povo brasileiro, vamos ajudar a melhorar esse país”.
Quem ouviu, ficou com uma percepção. Foi mais do que uma entrevista. Foi quase uma pregação num terreno até árido, mas nem tão deserto assim.
Para usar uma analogia bíblica, como a candidata, há uma ‘rebanho’ atônito à procura de alguém que guie a abrigo seguro.
Uma terra tão prometida, mas sempre negada pelos faraós.
Um caminho de nova ‘aliança’, não do dilúvio. De salvação, não de crucificação. Do perdão, não da pedrada.
Uma palavra para refletir. Sobretudo, os que têm “fé” no Brasil. Um Brasil de união, não de separação.
Ouça a entrevista na íntegra. Vale a pena.