Mais do que os eventos de uma disputa eleitoral em si, o que interessa, nessa fase da corrida, é tentar entender a leitura que os contendores estão fazendo da disputa.
Lá da cadeia, Luiz Inácio Lula da Silva, ainda candidato do PT à Presidência, já faz o seu prognóstico, que até coincide com o de muitos “politicólogos”. Mas há nele boa dose de crença. Não sendo isso, pode ser coisa pior: a aposta no dilúvio. Esclareço o que quero dizer.
Em carta endereçada a rádio Guaíba, do Rio Grande do Sul, o líder petista desceu o sarrafo em Geraldo Alckmin, candidato tucano à Presidência, e em sua vice, a senadora Ana Amélia (PP). Pior: por caminhos tortos, ligou um episódio de violência, de que sua caravana foi vítima no Paraná, aos dois adversários. Afirmou ter sido recebido com muito carinho pelos pobres, mas com hostilidade pelas elites.
Escreve, então, o petista:
“Importante lembrar que tal ato de violência foi elogiado por uma senadora gaúcha, hoje candidata a vice-presidente na chapa tucana. Aliás, quando logo depois do ônibus em que eu viajava ser atingido a tiros no Paraná, o candidato do PSDB a presidente da República justificou o ato terrorista dizendo: ‘O PT colhe o que planta’ Esse é o retrato fiel da elite brasileira”.
De fato, Alckmin pronunciou a frase infeliz. E eu o censurei aqui. Ele depois a retirou e condenou a violência. Com efeito, Ana Amélia assim se expressou sobre a hostilidade em cidades do Rio Grande do Sul à caravana liderada por Lula:
“Penso que nós, o Rio Grande, sabemos fazer política de maneira respeitosa. Atirar ovo, levantar o relho, é para mostrar onde estamos nós, onde estão os gaúchos. Nós respeitamos, eles nunca nos respeitaram (…). Vocês precisam saber da maldade que são capazes de fazer com seus adversários. Por isso que hoje quero cumprimentar Bagé, Santa Maria, Passo Fundo, Santana do Livramento, que botou a correr aquele povo que foi lá levando um condenado.”
Uma nota: o discurso de Ana Amélia é do dia 24 de março e se referia a cidades gaúchas. O ataque a tiros ao ônibus do PT aconteceu só no dia 27, em Quedas do Iguaçu, no Paraná. Não são, é claro!, frases felizes, por mais que o PT, no poder, tenha dado reiteradas mostras de intolerância. A resposta, obviamente, não é a hostilidade que se viu, com ameaça de confronto físico. Sempre há alguém que resolve que é chegada a hora do tiro. Mas o que importa é outra coisa.
Por que Lula vem com essa história na antevéspera do início do horário eleitoral gratuito? Há duas apostas aí:
A primeira: Alckmin deve crescer e disputar o segundo turno; hoje, ele está empatado em terceiro lugar com Marina e Ciro quando o chefão petista aparece entre os candidatos, e fica também em terceiro na simulação sem o petista, mas aí só com Ciro, já que a candidata da Rede assume a segunda posição. Nessa prefiguração, Alckmin desbanca Bolsonaro como o candidato anti-esquerda;
A segunda: ele, Lula, vai conseguir operar a transferência de milhões de votos para Fernando Haddad. Na hipótese de uma leitura virtuosa, o ex-presidente vislumbraria um embate final Alckmin-Haddad.
Mas não se descarte a leitura perversa. O PT deve saber, a esta altura, que não será fácil impedir que Bolsonaro vá para o segundo turno. Pra começo de conversa, a transferência de votos para Haddad pode não acontecer no volume esperado. Bolsonaro, a exemplo de Lula, mantém uma conversa fácil com fatias do eleitorado que não tem lá grande apreço por instituições. Petistas e tucanos, aliás, correm o risco de ter de tomar uma decisão entre o candidato do PSL e a alternativa. O que faria um tucano entre Bolsonaro e um petista? O que faria um petista entre Bolsonaro e um tucano?
A despeito da colossal diferença entre PSDB e PT, seria prudente que um e outro não incendiassem os navios. A menos que já tenham começado um namoro com o caos.
RedeTV