Os riscos da democracia. Por Delfim Neto – Heron Cid
Bastidores

Os riscos da democracia. Por Delfim Neto

24 de maio de 2018 às 08h55 Por Heron Cid

O nível de desintegração da administração pública na União, e a coisa não é muito diferente na grande maioria dos estados e municípios, tornou o Brasil inadministrável. Há esperança de uma substancial melhora com os poderes Legislativo e Executivo que provavelmente se formarão na próxima eleição?

Para o Executivo a incerteza ainda é enorme. Não há dúvida, entretanto, de que precisamos eleger alguém com inteligência para assumir o protagonismo necessário ao restabelecimento da harmonia com o Legislativo e o Judiciário. Sem isso a governabilidade não voltará.

Talvez seja possível fazer uma melhor avaliação do Legislativo que emergirá do processo eleitoral projetado com a maior competência pelo atual Congresso para continuar no poder. De fato, a longa experiência desde 1998 (cinco eleições) sugere que o número de deputados reeleitos entre os que se candidataram sempre andou em torno de 65% a 70%.

Incluem-se aí os “dinásticos” (esposas, irmãos, filhos, netos, sobrinhos etc.) dos que se aposentam depois do sexto ou sétimo mandato. A média dos “reeleitos” no mesmo período é de 280, com baixa dispersão. Em 2018, temos 447 deputados procurando reeleição, o maior número desde 1988. Em condições normais de pressão e temperatura (resfriada pela Lava Jato, mas esquentada pelas regras da nova lei eleitoral), deveremos assistir à reeleição de 290 a 310 dos 447.

Por outro lado, parece evidente que as lideranças dos vários partidos estarão de volta e continuarão no comando de quase 60% de seus membros. A não ser por um cataclismo, teremos na Câmara que vai ser eleita um pouco mais do mesmo.

Será composta de uma maioria experimentada que conhece os problemas e sabe tirar proveito disso, mas com as mesmas virtudes e os mesmos pecados da legislação anterior. Ela só se comportará diferente se o presidente, eleito por uma clara maioria, tiver inteligência e musculatura para aprovar:

1. Um sólido programa fiscal a partir de uma reforma da Previdência que encontre apoio na sociedade.

2. Insistir no equilíbrio fiscal.

3. Utilizar os recursos e a economia dos juros da dívida disso resultante no financiamento de investimentos públicos que, ao atenderem às demandas sociais de segurança, saúde, educação, saneamento e mobilidade urbana, acelerem a criação de emprego, ainda que precário.

4. Aprove as medidas que Temer deixou na agenda.

5. Continue com a política de aumento da produtividade geral da economia (as medidas microeconômicas programadas, a autonomia do Banco Central, a desintoxicação das empresas estatais e, principalmente, o desaparelhamento das agências reguladoras).

Para pôr “ordem na casa”, é preciso que lembre a todos que, pela Constituição, “todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos”. O único que recebe diretamente a clara missão de representar a maioria da cidadania que exprimiu sua vontade na eleição é o presidente da República.

O seu poder é limitado e regulado apenas pelos próprios dispositivos constitucionais sob controle do Supremo Tribunal Federal. Mas quem é o Supremo? São 11 brasileiros não eleitos, escolhidos pelos poderes eleitos, que recebem a honra de uma missão quase divina: exercer o poder moderador que garante a nossa liberdade, a independência e a harmonia entre os Três Poderes.

Como o presidente eleito diretamente, o STF pode quase tudo, mas, como ele, é sujeito à mesma Constituição. Pode julgar a inconstitucionalidade de uma lei quando demonstra, logicamente, que ela viola algum dispositivo constitucional, mas não há artifício lógico que lhe permita legislar substituindo-se ao Congresso Nacional.

Principalmente porque temos uma Constituição analítica com 250 artigos, que regula até transfusão de sangue, cujo maior objetivo é evitar toda interferência do poder do Estado nas liberdades individuais.

Foram, de um lado, a destruição do protagonismo da Presidência sob Dilma e, depois, o tumulto que, infelizmente, se abateu sobre a Presidência de Temer que estimularam a emergência da judicialização da atividade executiva, acompanhada pela politização da Justiça e, agora, a judicialização da própria Justiça! Ou, depois das eleições, todos voltam para suas caixinhas definidas no “livrinho”, ou continuaremos a destruir a democracia…

Carta Capital

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