Alckmin não pode fingir que cunhado não existe. Por Josias de Souza – Heron Cid
Bastidores

Alckmin não pode fingir que cunhado não existe. Por Josias de Souza

21 de maio de 2018 às 10h04 Por Heron Cid

Geraldo Alckmin reage às investigações que o assediam de maneira peculiar. Seja qual for a acusação, manda dizer que “continua disposto a prestar todos os esclarecimentos necessários às autoridades competentes.” Embora seja candidato à presidência da República, parece considerar que não deve nada ao eleitorado, muito menos explicações.

As pesquisas indicam que o presidenciável tucano talvez tenha perdido a hora de compreender que o potencial do seu projeto escoa pelo ladrão. Na sondagem mais recente, do instituto MDA, a taxa de intenção de votos de Alckmin caiu de 8,6% para 5,3%. Em alta, só a sua rejeição, que subiu cinco pontos e já registra 55,9%.

Estavam sobre a mesa as delações dos executivos da Odebrecht. Somaram-se a elas novas acusações de representantes da CCR, concessionárias de rodovias que resultou de uma sociedade da Andrade Gutierrez com a Camargo Corrêa. Em ambos os casos os depoentes mencionaram um nome: Adhemar Ribeiro.

Adhemar é irmão de Lu, a mulher de Alckmin. Não faz nexo atribuir o risco de naufrágio do candidato às nuvens que os delatores colocaram sobre sua embarcação e fingir que não há um cunhado no convés. Os trovões da Odebrecht e da CCR espantam menos do que o fato de Alckmin não ter brindado Adhemar com um raio que o parta.

No caso da Odebrecht, o cunhado foi apontado como intermediário de Alckmin no recebimento de parte dos R$ 10,3 milhões provenientes do departamento de propinas da empreiteira. Na investigação da CCR, Adhemar é mencionado como coletor de algo como R$ 5 milhões.

O nome de Alckmin soou nas delações de pelo menos dois executivos da Odebrecht. Benedicto Júnior, chefe do Departamento de Operações Estruturadas, eufemismo para setor de propinas, contou que a empreiteira repassou dinheiro de má origem para as campanhas de Alckmin em 2010 e 2014.

O executivo Carlos Armando Paschoal declarou que, na campanha de 2010, R$ 2 milhões foram entregues ao cunhado. “Passei a contactar o Adhemar Ribeiro, que definia locais de entrega dos recursos. As entregas foram preponderantemente feitas no escritório dele.”

Pode-se acusar a Odebrecht de muita coisa, mas é impossível deixar de admirar sua organização. O pagamento de propinas a políticos cabia a uma divisão da empresa criada exclusivamente para este fim: o setor de Operações Estruturadas. O departamento tinha suas próprias instalações e seu próprio corpo de funcionários — e, desgraçadamente para Alckmin, seus próprios arquivos.

Ainda é desconhecido o grau de sofisticação da caixa paralela da concessionária CCR. Mas num ponto as revelações de seus representantes coincidem com as delações da Odebrecht: as coletas de Adhemar Ribeiro são associadas à campanha de Alckmin em 2010.

Quando diz que “continua disposto a prestar todos os esclarecimentos” e, simultaneamente, sonega explicações sobre o irmão de sua mulher, o presidenciável tucano está, no fundo, pedindo à plateia que faça como ele: se finja de bobo pelo bem da melhor candidatura que a oligarquia tucana pode oferecer ao Brasil.

Cada minuto que Adhemar permanece em cena sem uma boa explicação, o problema aumenta. No estágio atual, é como se Alckmin tivesse do seu lado não um cunhado, mas um elefante. Para o tucanato, está combinado que nada aconteceu. E pelo resto da campanha, Alckmin viverá uma experiência surreal.

Há um elefante no convés. E ninguém comenta. Alguns promotores distraídos esbarram na tromba do animal. Mas Alckmin e o tucanato convencionaram que o elefante não está lá. Mais: se tromba houvesse, seria da alçada da Justiça Eleitoral, não da Lava Jato ou da promotoria paulista.

O problema de certos espetáculos políticos é que o eleitor não foi bem ensaiado para o papel de bobo.

UOL

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