Recentemente escrevi dois artigos sobre um fato inquestionável: Ciro Gomes é um candidato do pólo reacionário. Ele não é uma opção da ala progressista, ao contrário, é um personagem de alta periculosidade, atuando de forma divisionista e parasitária. Está, na prática, alijado das fundamentais lutas do Brasil de hoje: a luta pela liberdade de Lula, a oficialização de sua candidatura e a garantia de que as eleições de outubro irão de fato ocorrer.
Escrever uma assertiva como essa: “Ciro Gomes é da direita” não é nada fácil. Custou-me enorme tempo de pesquisa sobre sua biografia, suas gestões como governador e ministro de Estado, suas posições políticas expostas em dezenas de entrevistas e a leitura atenta de todas as suas obras, em especial a sua principal: “O próximo passo – uma alternativa prática ao neoliberalismo”, escrita em conjunto com Mangabeira Unger.
Ainda assim, uma enxurrada de seus seguidores escreveram dezenas de mensagens de ódio e reprovação, avaliaram negativamente a minha página, me acusando ora de estar a serviço da direita, ora de ser um petista fanático, um adulador de Lula. Dentro das inúmeras mensagens percebi ilusões, desilusões, desinformações, militância profissionalizada e paga por Ciro e – o mais importante – fortes críticas reacionárias às gestões Dilma, Lula e ao PT como um todo.
Aqui já caberia afirmar que, ainda que aceitássemos a precária tese de que Ciro Gomes não é um expoente da direita, com certeza uma grande parte de seus seguidores é – em discurso e posições de ódio – a personificação do reacionarismo.
Mas o objetivo central dos dois artigos acabou por atingir suas metas centrais: denunciar e armar com um bom repertório de argumentos aqueles que são da esquerda e que podem estar desavisados do perigo que representa a candidatura de Ciro Gomes no atual cenário político.
Entretanto, ficou sob minha pessoa a suspeição de que, se não sou da direita, com certeza seria parte de alguma ala sectária do PT que quer colocar em polvorosa a sua militância contra uma suposta boa opção contra a direita representada por Bolsonaro e Alckmin.
Na realidade, embora seja filiado ao PT desde 1991, nunca fui convidado para, e também nunca pleiteei, nenhuma posição dentro do partido, em nenhum âmbito. Nunca tive acesso às suas lideranças e não tenho qualquer relação com os membros de seu diretório nacional. Sempre fui um militante solitário e tive apenas ao longo de todos esses anos a companhia do marxismo – a ciência da libertação do proletariado e da humanidade – e o compromisso moral de lutar pela transformação social amparando-me sempre na verdade, fiel ferramenta revolucionária.
Durante a era petista não faltaram de minha parte posições críticas sobre as linhas que Lula e o PT tomaram em suas gestões. Importante salientar, porém, que nunca tive dúvidas das dificuldades que suas lideranças atravessavam ao levar adiante o desafio de governar um país grotescamente reacionário, tendo à frente o primeiro presidente operário de nossa História. E seu êxito eleitoral continuado revelou o sucesso de suas estratégias, que só puderam ser interrompidas por um brutal golpe de Estado.
E esse golpe foi um grande aprendizado para o povo brasileiro, para os petistas, mas sobretudo para os partidos de esquerda que acreditavam ser o PT um partido que estava compromissado com as elites.
No final, a direita, o grande capital nacional e internacional e os grandes meios de comunicação não foram atrás das cabeças do PC do B, do PSOL e muito menos de Ciro Gomes. Foram atrás de Dilma, do PT e sobretudo de Lula. Aqui trata-se de completar um exercício da lógica abdutiva: a hora é de união de todos em defesa do PT, de Dilma e de Lula. O PSOL foi o partido que melhor compreendeu essa lição, seguido do PC do B.
Ciro Gomes por sua vez ficou na oportunista postura de abutre da miséria alheia. Excluído dos círculos da direita por ser inoportuno, destemperado e desagregador, esperava que poderia nesse momento colher os espaços vazios da destruição do PT e de Lula. Criticava com uma mão o processo golpista e com a outra batia forte justamente em Dilma, no PT e em Lula.
No fim, ao ver que nenhuma de suas metas havia dado certo, resolveu difamar a verdade histórica que vivemos: se auto-proclamou como o legítimo sucessor de Lula e fez o serviço que a direita queria, qual seja, tentar legitimar as eleições sem Lula. E Ciro foi além… disse que a prisão de Lula não era política e que uma vez presidente não lhe concederia indulto, pois isso seria “contrariar sua própria linha de defesa”.
Mas nada disso é surpresa vindo de um político que nunca acreditou na democracia popular. No exame atento de sua principal obra (“O próximo passo”) encontramos pérolas que convencem em definitivo o leitor de que Ciro não é apenas um candidato da direita, mas o verdadeiro herdeiro das correntes ultra-neoliberais que estão em voga.
Vejamos algumas delas:
Ciro defende a realização de “privatizações espetaculares”, uma forte tributação sobre o consumo (30%), tributações sobre herança e doações e uma reforma previdenciária radical que faria o sistema atual ser gerido na forma de “banco de investimento”, ou seja, a contribuição dos trabalhadores seria jogada no cassino do mercado financeiro para obter supostos rendimentos mais agressivos. Tudo isso, no fim, para gerar uma forte poupança interna que garantiria a atração de capitais mais perenes no Brasil.
No fim, o plano de Ciro é criar um país que seja a legítima morada do Diabo e que aqui ele estabeleça residência fixa…
Mas o seu livro é ainda mais ambicioso: fala em “desideologizar” as privatizações (o que significa vender as nossas principais estatais estratégicas) a começar pela Telebrás. Fala em reformar o presidencialismo e torná-lo em um semi-parlamentarismo, propondo – no caso de discórdia entre Congresso e presidente – a convocação de eleições gerais.
Todo o seu ideário, supostamente desenvolvimentista, está ancorado na entrega dos recursos públicos nas mãos da iniciativa privada ou na submissão do Estado aos seus interesses. Nas suas 5 diretrizes de governo defende, sequencialmente, (1) vender as riquezas nacionais em benefício das finanças do Estado; (2) submeter o Estado aos interesses das empresas privadas; (3) deixar os aumentos salariais sob a tutela do empresariado; (4) promover a educação pública sem o Estado como principal agente e, por fim, (5) manter baixa a taxa cambial.
Seguindo os seus ideais, o melhor seria deixar Temer no governo… Pois é exatamente essa a agenda que os golpistas estão executando no Brasil…
Poderia me estender ainda mais nas ideias ultra-neoliberais defendidas por Ciro Gomes, apontando dezenas de incongruências, falácias e sobretudo as grandes brechas para o benefício do grande capital nacional e internacional. Sua obra fala em flexibilizar tudo em benefício da iniciativa privada.
Não há uma linha em defesa da reforma agrária, da reforma urbana, da taxação de grandes fortunas, na regularização do sistema financeiro e muito menos na construção de um projeto minimamente socialista e democrático. Seu livro é um libelo reacionário que envergonharia em estilo o seu maior mentor: Roberto Campos, o autor de cabeceira dos militares de 64.
Mas, por diversas vezes me perguntaram: “Se Ciro não é uma opção o que fazer agora?” “Quem devemos apoiar?” “O que devemos fazer?”
A resposta é simples.
Devemos continuar pela luta incansável e abnegada pela candidatura de Lula e gritar em alto e bom som: LULA LIVRE e LULA CANDIDATO. Ninguém aqui é ingênuo. Todos sabemos que é possível que Lula seja impedido de concorrer nessas eleições. Mas devemos levar essa luta até o final (meados de setembro) de modo que, caso haja seu impedimento, o candidato que Lula apontar será aquele que terá a transferência de mais de 90% de seus votos, como já ocorreu no impedimento de outros candidatos em eleições ao redor de todo o Planeta Terra.
Por essa razão Ciro Gomes quer que não tenhamos mais esperanças o mais breve possível. Isso porque sabe de duas coisas: primeiro de que essa estratégia é a correta (vejam que Lula continua a crescer nas pesquisas eleitorais) e segundo, porque sabe que Lula não o indicará como seu candidato.
Ciro se torna, assim, numa ferramenta da direita, infiltrada no interior da esquerda.
Os tempos que vivemos são duros. Devemos confiar na abnegação e na sinceridade de Lula nesse momento. O seu sofrimento não é nada pequeno. Apesar de erros e vacilos que possa ter tido, ele é um homem digno e representante fiel da classe trabalhadora. Devemos, por outro lado, rechaçar Ciro Gomes e colocá-lo no ostracismo o qual ele sempre pertenceu, junto com os setores reacionários que em nada podem acrescentar ao povo brasileiro, senão a miséria e a morte de nossas esperanças.
Esse é o duro dever que cabe a cada um de nós. O duro ofício de lutar pelo Brasil, pela democracia e pela verdade – apesar dos ataques e dos desgastes que isso possa ocasionar de forma temporária a cada um de nós. Nunca foi fácil lutar por esses valores. Por que hoje isso seria diferente?
Brasil 247