Já houve um tempo em que a imprensa não era mera caudatária das teses influentes ou refém da sensação, que nem sempre é um pensamento, da maioria. Deu-se antes do advento das redes sociais. Infelizmente, os dias em curso não conseguem fazer a necessária distinção entre o popular e o populista. Há muito tenho dito e escrito que o Brasil ainda sentirá saudade do governo de Michel Temer. Não precisei que o próprio editasse uma cartilha para destacar seus impressionantes feitos em apenas dois anos. Editado o texto e tornado público, como se viu nesta terça, ainda assim, como é notório, a reação da própria imprensa foi de desconfiança, como se o material fosse mero panfleto publicitário.
E não que a depredação das escolhas certas, sensatas, racionais, que fazem bem ao país, seja uma novidade entre nós, não é mesmo? FHC fez certamente o melhor governo desde a redemocratização do país e um dos melhores da história. Ocorre que a máquina então encarregada de produzir “verdades coletivas”, o PT, demonizou a melhor herança do adversário.
A gestão que nos devolveu uma moeda; que reconstruiu a ideia do preço, que se havia perdido; que domou a superinflação; que deu início à modernização do Estado, depois abortada; que recolocou no seu lugar o mercado como o principal fator de desenvolvimento; que venceu anos de atraso com a simples privatização de algumas estatais, bem, esse governo foi mandado pelo petismo para a lata do lixo. E, não há como ignorar, houve uma reação passiva da imprensa diante do desmanche moral do que era uma herança bendita, nunca maldita. Pistoleiros que tiveram interesses contrariados ajudaram a satanizar as privatizações como mero ato de pirataria contra o bem público.
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, como escreveu o poeta. Um novo valor se alevantou, e a noção um tanto tacanha de “justiça social” que o PT havia tornado influente foi substituída por uma nova verdade coletiva: a caça aos corruptos. Transformou-se a necessária profilaxia nas relações entre o setor público e o setor privado num novo valor absolutista. Quando isso acontece, a primeira coisa que se perde é o critério. Quando isso acontece, a primeira faculdade que sai comprometida é a capacidade de julgamento.
E, então, nada mais resta a ser exaltado senão o novo valor que se passa a adorar como um fetiche. Perde-se a objetividade. Em seu lugar, entra o culto religioso em homenagem ao Deus entronizado: antes, todas as virtudes do governo FHC foram rendidas no altar da “igualdade social”, que o tucano não teria promovido, o que é falso. Todas as virtudes do governo Temer, agora, se diluem no Bezerro de Ouro da hora, que é o combate à corrupção. E uma nota à margem: do próprio governo Lula, que chegou a ser religião influente em passado nem tão remoto, não sobraram nem as qualidades. E algumas havia.
E, lamento constatá-lo, os entes da sociedade que deveriam ser isentos para, afinal, aprovar o que tem de ser aprovado e descartar o que tem de ser descartado, acabam perdendo a isenção. Deixam de ser os juízes criteriosos de uma opinião pública qualificada para se tornar meros alto-falantes do alarido. A imprensa deixa de ser uma referência de objetividade e se esforça, ela própria, para ser legitimada pelo vozerio sem dono que opinião pública não é, mas gritaria histérica de grupelhos organizados.
E isso, meus caros, acaba nos conduzindo às piores escolhas.
RedeTV