Em 2013, uma onda de protestos da esquerda acabou despertando, como resultado inesperado, um movimento de direita que mudou a política brasileira. Parece que os astros se combinam para pregar uma peça parecida agora.
A opção de Michel Temer de decretar a intervenção no Rio naturalmente se alinhava com a sua pretensão política de recuperar popularidade, se não para disputar a reeleição, ao menos para ganhar peso nas negociações sobre a sua sucessão.
A reação do público, ainda antes do assassinato da vereadora Marielle Franco, frustrou o plano. Os brasileiros endossam em massa a intervenção, mas não dão colher de chá ao presidente, cuja aprovação continua entre as piores já registradas.
O efeito mais importante do decreto até aqui foi o de federalizar de uma vez por todas o tema da insegurança.
Então ocorreu o massacre da representante do PSOL. Uma rede de solidariedade mais ampla que a dos simpatizantes da esquerda se formou para repudiar o crime estúpido. A esquerda pensa, como pensava no início das marchas de 2013, que ganhou uma bandeira de luta política.
Mas o impacto político e eleitoral de um assassinato ocorrido há apenas cinco dias ainda está longe de poder ser aquilatado. O episódio desgasta o governo Temer? É possível, mas machucar o que já está esfolado não vai significar grande feito.
E se a coisa funcionar ao contrário do que deseja o progressismo? E se ajudar a aprofundar no eleitor a sensação de insegurança e a convicção sobre o fracasso das forças regulares da ordem, bem como dos partidos e candidatos que a têm representado?
No mundo de hoje, choques de insegurança que acometem uma sociedade —pela via do terror, do crime ou da migração— tendem a empurrar o pêndulo da política para a direita intolerante. No Brasil será diferente?
Jair Bolsonaro esfrega as mãos ante a perspectiva de jogar em casa as partidas decisivas desta eleição.